domingo, 20 de setembro de 2009

13- Lião I

13
PRIMEIRO CONCÍLIO DO LIÃO
(XIII Ecumênico, segundo Roma)




Reunido na cidade de Lião, França, no ano 1245. Convocado pelo papa Inocêncio IV, para, principalmente, sentenciar a questão do papa com o imperador.

Antecedentes

O Imperador Frederico II, acontecida já morte de Inocêncio III, livre já da tutela de seu mentor de robusta personalidade, ocupou-se de reivindicar os direitos do Império. Mas vendo-se envolto em antagonismos com o papado, habilmente decidiu prometer entrar em defender os interesses da Igreja, como o de partir logo à Cruzada aprovada no anterior concílio. Mas no que ele pôs especial empenho foi na perseguição dos hereges, e não porque tivesse especial interesse por motivos religiosos, a não ser devido a que sob pretexto de heresia, lhe apresentava a oportunidade de exterminar a seus inimigos políticos. Com estas estratagemas obteve que o papa Honório III (1216-1227) coroasse-o Imperador em 1220.
Mas o papa Gregório IX (1227-1241), sucessor de Honório, excomungou ao Imperador, e este, em um gesto mais de astúcia política que de penitencia religiosa, partiu para a Palestina, mas em vez de usar as armas, contraiu matrimônio com a princesa Isabel, herdeira do reino da Palestina. Como resultado de algumas aproximações pacíficas com os muçulmanos, assinou um tratado com o Malek o Kumel do Cairo, por meio do qual tanto cristãos como muçulmanos podiam conviver nos Lugares Santos e adorar em seus respectivos templos e mesquitas. Como é de supor, esta cruzada pacífica não foi bem vista pela hierarquia romana, porque lesava os interesses do papado, e era visto como um desacato à autoridade espiritual do papa; de maneira que o papa e o imperador, pelas intrigas da política de seu tempo, acusavam-se mutuamente mediante libelos e rumores; o que trouxe como conseqüência outra excomunhão para o Imperador Frederico II, e acusações de heresia e blasfêmia; e mutuamente se acusavam de ser "o precursor do anticristo".
O enfrentamento armado tivesse sido nefasto para o papado, de modo que o supremo pontífice decidiu usar frente ao Imperador a arma da pluma, mediante a recopilação de uma série de "Decretais ", para reclamar a supremacia papal, apoiadas, como é de supor, nas "Pseudo-Isidorianas", às que já nos referimos.
Em 25 de junho de 1243, Sinibaldo Fieschi, cardeal da Gênova, era eleito papa, quem tomou o nome do Inocêncio IV. Para essa data, Frederico II se deu procuração dos Estados da Igreja, tempo no qual o Imperador fechou as rotas terrestres e marítimas, capturando muitos bispos, arcebispos e cardeais que na ocasião iam ao chamado papal para a celebração de um concílio que pusesse fim a aquela situação; inclusive alguns prelados e muitos genoveses morreram nos enfrentamentos armados.

O Concílio

Inocêncio IV, resultou sendo uma papa enérgico e decidido a fazer prevalecer as pretensões teocráticas do papado romano; não obstante que Roma estava sitiada, procurou a forma de burlar o cerco e viajou até a França, e na cidade do Lião, em 3 de janeiro de 1245, convocou um concílio.
Embora seja de supor que a este concílio assistiram 140 prelados da igreja latina, entretanto esta cifra é duvidosa para os historiadores; e até tendo-a por certa, historicamente este concílio é considerado um simples sínodo, e tido por concílio ecumênico só pelo mandato do papa romano.
Suas sessões, que foram três no total, abriram-se em 28 de junho de 1245, na catedral do Lião. O ponto central a discutir era a situação da Igreja frente ao Imperador, a quem lhe acusou de perjúrio, sacrilégio e heresia, e de mau trato contra os prelados. Finalmente Frederico II foi novamente excomungado, e sem consultar nem sequer com a representação eclesiástica alguma, menos a política, da Itália e Alemanha, Frederico foi deposto como Imperador e como Rei da Alemanha, jogando o papado o destino dos países europeus apoiando-se em fábulas e pretendidos direitos sobre o mundo, como pretendido dono e senhor de todo o mundo e suas nações, pessoas, bens e coisas em geral.
Inocêncio IV era um homem de um caráter enérgico e ambicioso, hábil político e dotado da astúcia capaz para declarar que não tinha sido Constantino quem deu o poder secular ao papado, como já se inventou, a não ser o próprio Cristo, declarando que o Senhor tinha baseado um reino terrestre e celestial; de maneira que o príncipe só era legítimo quando tinha recebido o poder secular por delegação do papa romano.
Vemos, pois, à cabeça da cristandade latina medieval a um autocrata apropriando do mundo no nome do Senhor Jesus, ordenando que todo clérigo devia obedecer ao papa até nas determinações injustas, pois quem julgava ao papa? E para firmar melhor esta tirania universal, dispôs as coisas de tal maneira que o clero mesmo estivesse integrado por homens ignorantes, que desconhecessem as Sagradas Escrituras; isto sem que se ignorasse que na missa se consegue fazer da hóstia o corpo de Cristo; de maneira que o clero, e quanto mais o laicado, só podiam saber que há um Deus que galardoa e castiga, as verdades básicas do Credo apostólico e toda a fileira de mentiras difundidas pelo romanismo medieval.
O que lhe acontecia, então, a quem se encontrassem com uma Bíblia em seu poder ou o pegassem conversando publicamente ou em privado sobre matérias de fé? Simplesmente era excomungado, e acabava como réu da Inquisição. De maneira, pois, que vemos os nefastos frutos da reforma gregoriana comentada nos capítulos anteriores.
Entre outras coisas, este concílio tratou de desalentar a sobrevivência de agrupamentos que surgiam em uma época em que ficou muito de moda a imitação das grandes ordens mendicantes ao estilo dos Franciscanos, Dominicanos, Carmelitas e Ermitões Agostinianos.

Conseqüências

Havendo-se ocupado principalmente em assuntos políticos, mais que nos anteriores, as conseqüências do primeiro concílio do Lião foram eminentemente políticas. Não nos deve sentir saudades, pois, observar que esse concílio é uma fidedigna declaração de que a Igreja definitivamente se converteu em uma força política mais, mas graças ao Senhor, a teocracia papal, embora fora sua mais alta ambição, não chegou a substituir de todo ao Império secular europeu que, por certo, tinha sido invenção do papado mesmo nos tempos de Carlos Magno.
Essas contínuas lutas e enfrentamentos entre o poder secular e o eclesiástico, entre o Imperador e o papa romano, em altares ao domínio das nações européias e até dos reino latinos de Constantinopla e Jerusalém, faziam muito dano a Europa, e foram o começo da debilitação e desprestígio paulatino de ambas as forças. Jamais se obteve um conveniente e prolongado equilíbrio nas relações entre o Estado e a Igreja. A partir desse momento, o papado maquiavélicamente foi transladando sua atração política da Alemanha para a França; enquanto isso a corrupção da cúria romana ia em aumento, em detrimento sobre tudo da cúria alemã, pois tudo o que tivesse que ver com esse reino, estava na mira da desgraça. OH épocas negras da história!

12- Latrão IV

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CONCILIO DE LATRÃO IV
(XII Ecumênico, segundo Roma)



Reunido a fins do ano 1215 na catedral de São João de Latrão em Roma. Inocêncio III, o pontífice romano que marca a máxima cúpula do poder e influência papal na Europa em todos os tempos, convocou o que se considerou a mais importante das assembléias do catolicismo romano, sobre o qual ele manteve o absoluto domínio.

Panorama do antecedente historico

O papado romano tinha chegado ao cume de seu poder, convertendo-se no dono indiscutível do Ocidente, podendo ditar sua vontade a todos os monarcas e príncipes e a todos seus súditos. Lotario de Segni, um filho de conde, foi elevado à tiara pontifícia romana aos trinta e sete anos de idade com o nome de Inocêncio III, a qual ostentou desde 1198 até 1216; tempo durante o qual governou na Europa com mão de ferro, sendo em realidade, a julgamento de um bizantino, "não o sucessor de Pedro, mas sim de Constantino", ultrapassando a audácia e ambição de Hildebrando. Com ele se aperfeiçoou a lei canônica de tal maneira que se estabeleceu o princípio de que o papa romano é o oráculo de Deus na terra, sem oposição possível por parte de nenhuma criatura. Tendo proclamado a independência política do papado, erigiu-se por cima de todos os reis e príncipes laicos, contribuindo a doutrina de uma teocracia pontifícia e o papa como imperador do mundo. Inocêncio III, não obstante ter acrescentado o poder papal como o fez, jamais recebeu na história o qualificativo de "grande", nem foi canonizado, como os outros "grandes".
Com apóio nas falsificações Pseudo-Isidorianas, sob o pontificado de Inocêncio III, o poder papal chegou ao cume, e sobre tudo com a falsa premissa de que ao apóstolo Pedro, mais que à Igreja, tinha-lhe sido crédulo o mundo; e para completar a farsa, antes de Inocêncio III os papas tinham assumido o título de vigário de Pedro, mas a partir deste papa, começou a chamar-se vigário de Cristo; mas foi mais longe, dizendo ser o vigário de Deus no mundo, de modo que todo poder político tinha que estar sujeito ao papa romana. Então, como vigário de Cristo podia ser rei de reis e senhor de senhores.
O papado romano jogou mão de qualquer interpretação a seu emprego das Escrituras para entronizar-se sobre o mundo inteiro. É assim como diz Inocêncio III que o fato de que Pedro tenha caminhado sobre as águas, dá-lhes direito, seus supostos sucessores, a governar sobre todas as nações. Deste modo a menção de duas espadas em Lucas 22:38, tomaram como a simbologia do poder eclesiástico e o poder real; mas o mais grave é que ambas pertenciam ao papa, o qual outorgava uma delas ao rei para que a usasse segundo suas instruções e ao serviço da igreja romana; e de fato pôs e tirou imperadores, reis, condes e outras dignidades seculares, conforme seus interesses. Tergiversou e interpolou deste modo textos bíblicos como Deuteronômio 17, fazendo dizer à Escritura que quem não se submetia à decisão do supremo pontífice romano era réu de morte.
Ao princípio, Inocêncio III teve a intenção de capitalizar com os valdenses, e em vez de "Pobres de Lião", ofereceu-lhes se convertessem em uma ordem monacal de "Pobres Católicos", mas quando isso ocorria, já os valdenses tinham tido clareza de que a igreja papal não era bíblica; de maneira que cruelmente foram perseguidos e milhares levados ao martírio. Quando em 1517 se iniciou a Reforma protestante, os valdenses, bastante dizimados mas firmes, estavam disseminados pelas regiões de Piamonte e Saboya, na Itália. Tinha Inocêncio III um exército próprio e uma maquinaria de numerosos legados pontifícios e de eclesiásticos associados com as ordens religiosas, do qual se valeu para perseguir os albigenses e aos judeus. Inocêncio III proclamou uma cruzada para exterminar aos albigenses, e para isso, por ser os bispos mais mercenários que pastores, utilizavam o braço secular para acabar com a "heresia", e oferecia o perdão de todos os pecados e o paraíso a todos os que se alistassem para acabar com os albigenses. A guerra contra os albigenses no sul da França (1209-1229), teve como conseqüência a Inquisição com suas fogueiras contra os que o sistema considerava "hereges". Por exemplo, em Beziers, baluarte dos albigenses, os cruzados papais organizaram um indescritível banho de sangue. Foi tanta a barbárie, a rapina, a crueldade e a destruição, que foi exterminada a quase totalidade da população de cidades inteiras, sem discriminar se eram albigenses ou não, nem respeitando a idade nem o sexo. Eles se gabavam de que a "vingança divina" nesse açougue não tinha respeitado nem classe social nem sexo nem idade, caindo sob a espada quase vinte mil pessoas. Contra os judeus a política era conseguir que se esfriasse sua perseverança para seus princípios religiosos, mais que de extermínio, sob pena de castigá-los por sua rígida postura. É claro que durante o reinado de Inocêncio III se destacou a intolerância religiosa.

O concílio

As sessões do concílio se levaram a cabo de 11 aos 30 de setembro de 1215, com a assistência de 800 abades e mais de 400 bispos da asa latina da cristandade, além de representantes do Imperador Frederico II, e dos reis da Inglaterra, França, Aragom, Hungria, e dos patriarcados latinos de Jerusalém e Constantinopla. Sem a assistência dos bispos gregos, Latrão IV foi na realidade um concílio da igreja papal, aonde os bispos se reuniram em três sessões para que fossem proclamados e ratificados os decretos papais, personagem que se adotou plena jurisdição na igreja, e os bispos eram apenas seus assistentes.

Aprovações no concílio

1. Condenação de Joaquim de Flora (ou Fiore) e seu monacato profético.
Joaquim de Flora (1130-1202) nasceu na Calabria, no extremo sul da Itália, e tendo ingressado em um monastério cisterciense, depois de ter sido ordenado sacerdote, a contra gosto tinha sido feito abade do mesmo desde 1178 a 1188. Sempre desejou um caminho de vida monacal mais rígida, estrita e austera que o que tinha vivido ali, e seguido por um bom número de discípulos, fundou um monastério, o de São João Fiore, o qual obteve a aprovação papal. Então, qual foi seu problema frente ao papado? Joaquín sentia um profundo pesar pela progressiva corrupção da igreja, e sendo um dedicado estudante de profecia, aplicou sua forma de ver as coisas, no entorno eclesiástico de sua época, à interpretação profética, sobre tudo o livro de Apocalipse, vendo factível uma reforma da igreja por leitos monásticos, aos quais pretendia "espiritualizar". Dividia a história em três idades ou dispensas: a do Pai, a do Filho, e a do Espírito Santo, as quais se compunham a sua vez de subdivisões, de tal maneira que o último período terminaria em uma sociedade comtemplativa. Como é de supor, sua curiosa interpretação profética, chocava-se com os princípios imperiais e interesses papais da época, instituição, com o Inocêncio III à cabeça, que condenou as visões proféticas de Joaquim de Flora. Como resultado deste incidente, e alarmados pela proliferação de novos movimentos monásticos, dispôs que qualquer que desejasse fundar uma nova casa religiosa, devia aceitar para seu governo as normas e disciplina das já existents

2. Condenação de Berengário de Tours e definição da "transubstanciação".
Como se sabe, o sistema católico romano, e particularmente os monastérios medievais, tinha chegado a converter o singelo memorial que celebrava a igreja primitiva do Jantar do Senhor, em uma diária renovação do sacrifício do Senhor no Calvário, ao qual chamavam Eucaristia, ou Missa, palavra que em latim significa reunião; de maneira que não é incorreto dizer que Cristo instituiu a Santa Ceia e os monges a Missa. Tenha-se em conta que nessa época a Bíblia se constituiu em um livro de proibida leitura, de maneira que muito poucas pessoas tinham o privilégio de conhecer as Sagradas Escrituras e ter a oportunidade de ser fiéis pelo menos a algumas das doutrinas apostólicas contidas no Novo Testamento; porque se o clero dessa época, ou pelo menos os que tivessem o poder de decisão, tivesse retornado à Escrituras, a Missa tivesse sido desterrada da igreja. Quanto a "transubstanciação" implícita na Missa, nessa época ainda não tinha sido declarada dogma, embora já começava a receber carta de legitimidade na igreja, e autores do nível de Pascasio Radberto de Corbie, no século IX já se pronunciaram a favor da mesma.
Dos poucos que conheciam os ensinos apostólicos, e muito antes deste concílio, Berengário de Tours (998-1088), versado teólogo, canônico que tinha sido da catedral do Tours e logo arque-diácono e professor do Angers, havia sustentado que a Santa Ceia não tinha que entender-se em sentido material a não ser espiritual; pelo qual tinha sido condenado em vários sínodos, e em forma definitiva neste concílio. O que é a "transubstanciación"? Este concílio a proclamou como um dogma, com a seguinte definição:
"Seu corpo e seu sangue (de Cristo) estão verdadeiramente contidos no Sacramento do altar sob as formas do pão e o vinho; o pão é transubstanciado em seu Corpo e o vinho em seu Sangue pelo poder divino, de maneira que para aperfeiçoar o mistério da unidade, nós recebemos Dele o que Ele recebeu de nós".
De maneira que por um ato de poder milagroso, o sacerdote aparentemente podia fazer que Cristo se convertesse em um biscoitinho e em um pouco de vinho, e como conseqüência só sob a mediação do sacerdote podiam participar os fiéis, do Filho de Deus, e só por eles ser salvos, pois os sacramentos, de acordo com esse sistema, são o único meio de salvação; então a situação é triste quando o catolicismo romano mais tarde no concílio de Trento, sela e faz normativo e imperativo que uma pessoa não pode ser salva a não ser através do batismo que lhe administra um sacerdote católico, de uma confissão de pecados a um sacerdote católico e comendo o pão e bebendo o vinho em que supostamente se converteu Cristo em virtude do exclusivo poder de fazer esse milagre que tem o sacerdote católico.
Se meditarmos um pouquinho nesta situação do romano-papismo, temos que já o papa, por meio de armas tão capitalistas como a excomunhão às pessoas que não lhe sujeitassem, e a interdição a cidades, regiões e até os países, punham sob sua sujeição aos reis; mas a isto lhe adicionou que por meio dos "sacramentos" podiam sujeitar a vida de todos os indivíduos. em relação à Ceia do Senhor, o que diz a Palavra de Deus? Que é um memorial. Diz 1 Coríntios 11:23-25: "Porque eu recebi do Senhor o que também lhes ensinei: Que o Senhor Jesus, a noite que foi entregue, tomou pão; e tendo dado graças, partiu-o, e disse: Tomem, comam; isto é meu corpo que por vós é partido; façam isto em memória de mim. Deste modo tomou também a taça, depois de ter ceiado, dizendo: Esta taça é o novo pacto em meu sangue; façam isto todas as vezes que a beberem, em memória de mim". Por que a Ceia do Senhor é um memorial? Porque ao comer o pão e beber a taça estamos participando e desfrutando da morte do Senhor, quem se nos deu mediante Sua morte na cruz; é fazer autêntica memória Dele como nosso Redentor; é anunciar Sua morte redentora, da qual se produziu a Igreja. De maneira que o pão e a taça do Senhor representam Seu Corpo quebrantado por nós, e Seu sangue derramado por nossos pecados.
Nas Escrituras não encontram fundamento algum que aprove que os sacramentos e decretos católicos romanos sejam os meios postos Por Deus para ser salvos. Nosso Salvador é Jesus Cristo. Diz João 1:12-13: "Mas a todos os que lhe receberam (a Cristo), aos que acreditam em seu nome, deu-lhes poder de serem feitos filhos de Deus; os quais não são gerados de sangue, nem de vontade de carne, nem de vontade de varão, mas sim de Deus".

3. Estabelecimento da Inquisição.
Não contentes com o anterior, embora já tivesse começado na prática, este concílio aprovou canonicamente a Inquisição, e instituiu os tribunais chamados do "Santo Ofício", por meio dos quais "santificavam" a repreensão sangrenta de toda atitude contrária ao papado romano; de maneira que através da história foram milhões os seres humanos que foram encarcerados, torturados, seus bens confiscados, queimados ou passados pelas armas apenas porque eram albigenses, valdenses, mouriscos, judeus ou protestantes. A respeito diz José Grau:
"Em contraste com o que tinha sido costume na antiga lei romana, a Inquisição tinha por culpados aos acusados enquanto não se provava sua inocência, coisa difícil quando mediava a tortura como instrumento ‘judicial’. Não podiam os acusados tampouco ouvir nem conhecer seus acusadores, de maneira que qualquer pessoa estava exposta à perversidade das calúnias de seus inimigos. Lhes negava todo amparo legal. Não podiam apelar nem recorrer a ninguém e ficavam desprovidos de todo assessoramento jurídico, pois qualquer advogado que tivesse tomado sua causa tivesse sido excomungado a sua vez. Os filhos tinham que denunciar a seus pais ou vice versa. Aos filhos dos hereges devia perdoar-se-os a vida, dizia Inocêncio III, como um ato de misericórdia, mas tinham que ser depostos de todos seus cargos, sem possibilidade de voltar a ocupar nenhuma dignidade civil, além de lhes serem confiscados todos os seus bens. Estes passavam, a metade ao tesouro papal e a outra metade aos inquisidores. As autoridades civis tinham que se encarregar das provisões de lenha para as fogueiras e das execuções decretadas pelo ‘Santo Ofício'".*(1)
*(1) José Grau. "Catolicismo Romano: Origens e Desenvolvimento". E.E.E., Barcelona. 1987. Pág. 350.

4. Legislação anti-judaica.
Este papa se enfureceu contra os judeus. Além das medidas contra os albigenses, este concílio decretou que todos os judeus levassem algum distintivo sobre suas vestimentas; ou seja, ordenou que os judeus e sarracenos tivessem que vestir um sambenito ( roupa usada pelos condenados da inquisição) ou indumentária especial que os distinguissem de outros. Parte do cânon dizia: "Os judeus, tanto se for homem como uma mulher, em todos os países cristãos e em lugares públicos devem distinguir do resto da população mediante um tipo especial de vestuário...". Com isso, em parte, evitaria-se a relação sexual entre judeus e cristãos, o qual era um delito. Com estas medidas, começava para eles a discriminação, a formação do "ghetto", a degradação e considerando-os escória, um espetáculo para os "cristãos" da época, e entre quem (cristãos e hebreus) desta maneira, e a partir do século XIII, foi criando um muro de separação, cujas bases foram postas pelo papado. Proibiu aos judeus ocupar cargos públicos. O concílio condenou a usura e proibiu aos cristãos ter trato comercial com os judeus, para evitar que estes a exigissem. No fundo queriam evitar que os cristãos, por pagar a usura aos judeus, pusessem obstáculos para que a igreja lhes cobrasse os dízimos. Proibiu aos judeus exercer "profissões cristãs" e os confinou em guettos, com imposição de um horário de saída e entrada.
Também este concílio se ocupou de grande variedade de controvertidos temas, dos quais enumeramos os seguintes:
* Reconheceu e confirmou a coroa imperial ao Frederico II, o protegido do papa.
* declarou-se contra a Carta Magna, a constituição política inglesa e a melhor da Europa, com a qual o povo inglês se livrava do foro papal, pois submetia a seu soberano, nesse momento João sem Terra, às leis determinadas por seu povo e não aos papas romanos. Mas os ingleses não cederam ante as pretensões papais nem ante as ameaças de excomunhão.
* Convocou aos reino feudais latinos a uma nova cruzada, a V, para a conquista de Terra Santa, chamada associada com a curiosa afirmação do Inocêncio III de que Maomé era o homem do pecado, o filho de perdição, a besta de que nos falam as Escrituras, e de que a seu reino (o dos sarracenos) já lhe aproximava seu fim, pois só seria de 666 anos. Mas esta cruzada, pelo lado da Terra Santa foi um fracasso, pois a anterior cruzada tinha deixado uma má lembrança entre os ortodoxos orientais, pois em vez de ir resgatar os lugares Santos, foram-se a saquear a Constantinopla, e a cometer toda classe de luxúrias e vexames, deixando nos gregos um rastro indelével.
* Estabeleceu um corpo de legislação mais amplo que qualquer outro concílio subseqüente, incluindo o do Trento.
* Procurou a reforma do cristianismo católico e o melhoramento de vida da cristandade. Ditou leis a favor de uma melhor preparação do clero católico, em uma época em que uma percentagem considerável dos sacerdotes desconhecia até as Sagradas Escrituras. Ordenou que em cada sede episcopal metropolitana houvesse uma cadeira de teologia.
* Redigiu definições precisas a respeito de muitas doutrinas cristãs, como uma fórmula da Trindade, e outras.
* Promoveu a união com a asa bizantina do cristianismo.
* Tratou de elevar o nível da vida matrimonial e de família, regulando as leis e impedimentos do matrimônio entre seculares.
* Impôs a todos os católicos o dever de fazer sua confissão a um sacerdote quando menos uma vez ao ano, pois a prática anterior da penitência consistia em castigo e restauração públicos. Também promulgou o preceito da comunhão pascal.


Conseqüências
É fundamental ter em conta que a reforma promovida por Hildebrando e Inocêncio III para o catolicismo romano, afetou em primeiro lugar ao clero e à organização eclesiástica, pois na prática não foi a não ser para engrandecer temporalmente esse sistema. e não para reivindicar os princípios bíblicos da Igreja, nem para levar ao ignorante povo da época a um maior conhecimento do Senhor e às práticas das doutrinas apostólicas.
É elogiável que este concílio se preocupasse porque em cada catedral houvesse um mestre de gramática e outro de teologia, para a instrução do clero, pois muitas vezes esse grêmio logo que sabia ler e escrever. Como estariam os paroquianos desses tempos? Quando movimentos evangélicos como os valdenses quiseram adiantar a educação bíblica às pessoas, foram perseguidos e obstaculizados. Por esse tempo, o saber se foi concentrando nos monastérios das ordens religiosas, assim como o desejo de viver uma vida mais Santa; de modo que o laico tinha muito pouca participação e conhecimento para alcançar uma perfeição evangélica.
Neste concílio e a culminação da reforma da igreja ocidental, estabelecia-se que por igreja só se entendia aos bispos, os abades, o clero e monges que se submetiam à autoridade do papa; e isso não mudou, com suas nefastas conseqüências. A partir do Inocêncio III foi decaindo a teocracia pontifícia que pretendera perpetuar a reforma gregoriana.

11- Latrão III

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TERCEIRO CONCÍLIO DE LATRÃO
(XI Ecumênico, segundo Roma)



Este concílio foi convocado pelo papa Alexandre III (Rolando Bandinelli) (1159-81). Reunido na basílica de São João de Latrão, em Roma, no ano 1179, para impor a disciplina eclesiástica. tomaram medidas adicionais para reformar ao clero frente à simonía. ocupou-se deste modo do cisma entre os papas do período do imperador Frederico I Barba roxa.

Antecedentes

Apesar do aprovado nos dois concílios latronenses anteriores, ainda seguia fermentando a virulência da teocracia legada por Hildebrando no romanismo; mas frente a esta teocracia, erigiam-se as ambições de Frederico I Barba roxa (1125-1190), quem subiu ao trono imperial com o firme propósito de reviver as idéias imperiais de Carlo-Magno, e restaurar a grandeza do Sacro Império Romano Germânico. depois de ter aprisionado a Arnaldo de Bréscia por suas idéias de restaurar a República em Roma, Frederico foi coroado em São Pedro em 18 de Junho de 1155 pelo papa Adriano IV, quem não via em Frederico a um governante superior ao papado, ao estilo de Carlo-Magno, a não ser a alguém inferior ao Supremo Pontífice, o qual teve suas irritantes conseqüências.
É interessante ter em conta que a supremacia que invocava cada um -papa e imperador- sobre o outro, refletia-se em abundantes regalias e benefícios. Frederico interpunha as concepções imperiais segundo o Direito Romano de Justiniano,*(1) querendo voltar assim para poder absoluto dos césares, mas o papa também movia suas fichas para reivindicar seus supostos direitos de suserano.
*(1) Favor ler o capítulo 5, Segundo Concílio de Constantinopla.

A Adriano IV o aconteceu no trono papal Alexandre III, experiente em doutrinas relacionadas com as pseudo-isidorianas e opositor contumaz de Frederico Barba roxa; mas a facção imperial escolheu ao cardeal Octaviano com o nome de Víctor IV, voltando-se para repetir temporalmente o caso de dois papas rivais, proliferando os sínodos para excomungar-se mutuamente; mas depois de muitos anos de lutas e intrigas, o imperador cedeu em favor do Alexandre III, a quem em um ato de arrependimento, e para que lhe levantasse a excomunhão, beijou-lhe os pés em Veneza, em 24 de julho de 1177.
Como é de se supor, frente a uma hierarquia eclesiástica dominante e entregue às intrigas feudais e interesses temporários e mundanos, houve reações do povo, às vezes mal enfocadas e fundamentadas em enganos, como o caso do movimento surto ao sul da França e norte da Itália, dos chamados Cátaros ("os puros") ou albigenses, de Albi, cidade francesa. Eles, embora de vida moralmente alta, retomando idéias gnósticas e maniqueas, eram dualistas; acreditavam em duas forças antagônicas igualmente eternas: uma que personificava o Bem e outra o Mal. De maneira que também estavam afastados da verdade do evangelho, atribuindo ao diabo todo ou parte do Antigo Testamento; eram inimigos do matrimônio, tendo-o por obra da carne; negavam a encarnação real e ressurreição corporal de Cristo; de maneira que eles atribuíam a salvação às obras de vida e ritos como o jejum, a repetição de certas orações e um chamado batismo espiritual. A reação do sistema contra tudo o que considerassem heresia e lhes opor, era perseguição com o uso da espada e a fogueira.

O concílio

Para consolidar a paz e apagar más lembranças, o papa Alexandre III convocou um concílio ecumênico, o qual se reuniu na basílica de São João de Latrão nos dias 5, 7 e 19 de março de 1179, com a participação de 291 bispos e abades, a maioria italianos. Em só três sessões, o papa fez passar em 27 cânones. Com razão o imperador chamou a este concílio "o concílio do Supremo Pontífice", o qual aprovou assuntos como os seguintes:
- Em adiante o papa seria eleito por uma maioria de votos das duas terceiras partes; sob pena de excomunhão e privação da ordem eclesiástica.
- Invalidação e deposição de todas as ordenações feitas pelos antipapas e seus ordenados.
- Proibição de possuir e usufruir várias dignidades eclesiásticas, pois às vezes uma só pessoa recebia o produto de várias paróquias, e por ser beneficiário ausente, empregava substitutos.
- Este concílio, além da excomunhão, proclamou uma cruzada contra os grupos considerados hereges, como os cátaros, a que foi, na opinião de alguns, a primeira ocasião em que o sistema católico romano empregasse este método contra quem se chamava cristãos.
- Houve também disposições contra os agiotas, sarracenos e piratas. Por exemplo, proibiu que os judeus e muçulmanos tivessem escravos cristãos. Este concílio, obrando em teoria em nome do cristianismo, declarou que nenhum cristão devia ser sujeito a servidão. Isto ia encaminhado a que entrassem novamente em vigor as antigas leis anti-judaicas, que proibiam rigorosamente aos judeus empregar cristãos a seu serviço. Aos cristãos lhes proibia viver nos bairros onde viviam os infiéis, como um passo para o futuro ghetto. Também este concílio declarou aos judeus suspeitos de colaboração com os "hereges" albigenses.
- Como em outros concílios medievais, legislou-se contra a simonía e a incontinência do clero.
- Pedro Valdo e seus seguidores, "os pobres de Lião", ante as restrições por parte de muitos bispos para pregar e evangelizar em sua qualidade de seculares, pediram a autorização a este concílio, mas foi negada. Embora o papa elogiou e admirou a pobreza dos evangélicos valdenses, não lhes concedeu o que solicitavam, apesar de que eles procuravam a reforma dos costumes sem apartar-se da obediência a Roma, nem criticá-la. Lástima grande, que cada vez que o Senhor tenha tocado as portas desse sistema para que voltem para Deus, fugiram de escutar os emissários do Senhor; ao contrário, perseguiram-nos, afrontaram-nos, golpearam-nos, encarceraram-nos, confiscaram-lhes seus bens e os levaram à fogueira. Não tiveram luz em seus olhos para ver o que o Senhor diz: "Se alguém quer vir em após mim, negue-se a si mesmo, e tome sua cruz, e me siga (Mateus 16:24). A linguagem dos valdenses era estranho para estes eclesiásticos, mais preocupados com as intrigas políticas e o engrandecimento do papado, que por glorificar ao Senhor que eles diziam representar, e ser instrumentos de Deus para a salvação das almas. Tão é certo o desta cegueira, que anos mais tarde um inquisidor de Passau chegou a declarar que os valdenses eram a seita mais perniciosa para a Igreja Romana, alegando que era a mais antiga, a mais estendida e por sua grande biografia de piedade. Isso nos demonstra que sempre houve um remanescente fiel ao Senhor e a fundamental doutrina dos apóstolos.

Conseqüências

Apesar da paz de Veneza e de sua ratificação no concílio, as fricções e lutas entre Federico e os sucessores do Alexjandre III no papado continuaram, até que o imperador pereceu afogado em 10 de junho de 1190, quando ficou à cabeça da terceira cruzada, em um intento por liberar o Santo Sepulcro.
O papa Lúcio III excomungou aos valdenses em um sínodo na Verona em 1183, mas eles, pela poderosa vontade de Deus, seguiram-se estendendo por todo Ocidente. Um sistema dominado pelo eclesiasticismo e a hierarquia clerical como o romanismo, vê uma ameaça em um movimento singelo e laico que além disso tem interesse em lhe ser fiel ao Senhor. Na história da Igreja, aos valdenses lhes conhece como um movimento precursor da Reforma, protagonistas como eram de uma luta frente a um sistema que se apartava cada dia mais da verdade; eram como um espelho onde podiam olhar os romanistas seus desvarios, enquanto que o papado se ia fortalecendo mais. Na medida em que o papado se afastava mais das doutrinas que pregava o apóstolo Pedro, mais se afundava nas "grandezas" das glórias terrenas pelas teorias legadas por Hildebrando sobre o governo da igreja romana e sua hegemonia universal.

10- Latrão II

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SEGUNDO CONCÍLIO DE LATRÃO
( X Ecumênico, segundo Roma)




Convocado pelo papa Inocêncio II no ano 1139, reunido na basílica de São João de Latrão em Roma, imediatamente depois da morte de seu rival Anacleto II. Produziu a excomunhão do monarca Rogelio II da Sicilia e a condenação dos seguidores de Pedro de Bruys, pregador precursor da reforma no sul da França e Arnaldo da Breséia em Roma, por opor-se ao papado. Neste concílio houve um intento de sanar a divisão entre a igreja ortodoxa oriental e o catolicismo romano.

Panorama preconciliar
No panorama preconciliar corriam ventos de reforma. Na cristandade medieval se destacaram figuras proeminentes como o monge abade dos cistercienses Bernardo de Claraval, conspícuo místico, que por escrito e em eloqüente oratória defendia o que em seu momento ele considerava ortodoxo, e ataca as "heresias". Bernardo estava convencido da graça perdoadora de Cristo, graça obnubilada por sua vinculação às causas oficiais da igreja de Roma. Apesar de ser devoto da Virgem, nunca acreditou na imaculada concepção de María. Por vir isto de um dos personagens mais destacados da cristandade medieval, este novo "dogma" se retardou durante séculos em ser aprovado oficialmente por Roma.
Em tempos de Bernardo, e durante sete anos, houve simultaneamente dois papas: Inocêncio II (Gregório Papareschi) e Anacleto II (Pedro Pierleoni, de origem hebraica), também conhecido como "o papa do ghetto"; mas Bernardo de Claraval se inclinou a favor de Inocêncio II, e influiu ante o imperador Lotário III para que ficasse ao lado de Inocêncio. Ambos os papas tinham a seu favor um setor da cristandade latina.
Houve outros personagens que nesse mesmo tempo desejavam uma verdadeira reforma da Igreja, a qual se apartou da primitiva pureza; além disso, a reforma segundo os princípios gregorianos tinha dado amostras de ser impotente. Os fatos registrados no Antigo Testamento foram escritos para nosso exemplo e luz. Nos tempos do profeta Elias, em meio de uma grande apostasia nacional, nem mesmo o profeta mesmo sabia que havia sete mil israelitas que se guardaram de adorar ao Baal. Também no século XII, Deus tinha preservado alguns núcleos evangélicos, antirromanistas e anti-hierárquicos; núcleos que sempre existiram ao longo de toda a história da Igreja. Se você for cristão no melhor sentido da palavra, e não apela aos legalismos, às tradições e o meramente eclesiástico e clerical, é porque apela à Escritura e ao Espírito.
Entre essas pessoas que em seu momento se opuseram ao sistema, destacam-se Pedro de Bruys, Henrique de Lausana e Arnaldo da Bréscia. Destes três personagens, transcrevemos as palavras de José Grau, em seu livro: Catolicismo Romano: Orígens e Desenvolvimento:

"Cabe destacar em primeiro lugar a Pedro de Bruys, sacerdote francês de vida quase ascética, que rechaçava o batismo de meninos, as cerimônias eclesiásticas, o sacerdócio e as orações pelos mortos. Atacava a Igreja visível e só reconhecia a invisível no coração dos verdadeiros crentes. Estava contra os templos e a veneração de crucifixos. Ensinava que o que foi instrumento da morte de Jesus devia ser desprezado, por isso se deu à queima de cruzes, as usando inclusive para cozinhar seu mantimentos. O povo supersticioso não pôde resistir ao radical reformador e o jogou à fogueira em 1124. Seus numerosos seguidores foram chamados petrobrusianos e se estenderam amplamente pelas terras dominadas pelo papado. Tanto Pedro de Bruys como seus seguidores, foram muito exagerados e radicais em questões secundárias, mas temos que interpretar suas reações à luz (ou melhor dizendo: à sombra) do tenebroso espetáculo religioso de seus dias".
"Henrique de Lausana, que ao parecer teve contatos com Pedro de Bruys, era um ex-monge de Cluny, homem muito erudito e piedoso, que se condoia pela falsa
e supersticiosa esperança que o povo tinha nas relíquias. Pregou veemente contra as relíquias e incitou ao arrependimento e fé genuínos. Acreditava além que os sacramentos seriam válidos somente quando fossem administrados por sacerdotes Santos. Condenava a ostentação e o luxo do clero de seu tempo e seguia o movimento petrobrusiano. O bispo de Arles, indignado pelo apostolado do Henrique, prendeu-o e o conduziu ante um Sínodo reunido em Pisa no ano 1135, de qual pôde sair livre, mas ao opor-se Bernardo de Claraval, foi preso novamente e condenado a prisão perpétua. Morreu em 1149".
"Figura lhe sobressaiam entre estes pioneiros da Reforma, é a de Arnaldo da Bréscia, do qual se ocuparia amplamente o papa Inocêncio II e seu segundo concílio de Latrão. Arnaldo era um jovem e entusiasta cônego que atacou com fervente oratória o poder secular da Igreja, apoiando-se em uma concepção mais espiritual e bíblica do Corpo de Cristo. Pregou em favor de uma Igreja mais Santa e pura, de acordo com o modelo da Igreja apostólica. Sustentava que só a renúncia das posses materiais e da ambição secular poderia levar a uma renovação autenticamente cristã. Enquanto as teorias do Hildebrando advogavam pela supremacia teocrática da Igreja, Arnaldo desejava a completa separação entre o Estado e a Igreja. Isto lhe levou a pedir a restauração da antiga República de Roma em substituição do governo secular do papa. Arnaldo acreditava firmemente que a missão da Igreja é puramente espiritual e que por conseguinte não tinha que ir depois do poder e as riquezas, a não ser contentar-se com os dízimos e as ofertas voluntárias
".*(1)
*(1) José Grau. Catolicismo Romano: Orígens e Desenvolvimento. Edições Evangélicas Européias, Barcelona. Tomo I. 1987. P. 314.

Milão e grande parte das províncias do norte da Itália tinham permanecido por séculos remissos a submeter-se à jurisdição do papado romano; de maneira que quando Inocêncio II obteve por fim as submeter a sua autoridade no ano 1133, aos poucos anos, nessas mesmas regiões surgiu o foco principal do grande movimento evangélico medieval dos valdenses, que toma seu nome de Pedro Valdo, e que se relacionam com os chamados "pobres do Lião", condenados no Concílio III de Latrão em 1179. Estas coisas aconteceram muito antes de que nascesse Martinho Lutero.

O concílio

Convocado o concílio pelo papa Inocêncio II, suas sessões de quase um mês de duração, celebraram-se na basílica de São João de Latrão, a partir de 4 de abril de 1139, com a assistência dos bispos e abades do ocidente somente.
Como é de supor, este concilio sob o domínio absoluto de Inocêncio II, procedeu a depor a todos os bispos e clérigos que tinham estado do lado de seu rival Anacleto II, com anátemas e acusações de hereges e cismáticos a bordo. Apesar de que Anacleto II tinha sido eleito por um número de cardeais ligeiramente maior que ao Inocêncio II. A quantos incautos e singelos crentes fariam mal os líderes romanos com todas estas medidas politiqueiras. você vá a entender estas coisas desses infalíveis personagens. Além disso o concílio:
- Condenou a simonía, a usura, o luxo e relaxação de clérigos e monges. A estes lhes proibiu estudar medicina.
- Declarou nulo o matrimônio contraído por clérigos e monges a partir do subdiaconado.
- Passou no cânon chamado de "Privilégio", que condenava com a excomunhão aos que injuriassem ou maltratassem com violências físicas aos clérigos.
- Condenou ao Arnaldo da Bréscia a guardar silêncio, e suas teorias a respeito de uma igreja apostólica e humilde, tidas por heréticas.
- O cânon 23 acusou de heresia a Pedro de Bruys, ao qual o povo queimou.
- Excomungou politicamente ao rei Rogério da Sicilia, por ter apoiado ao Anacleto.

Conseqüências

Arnaldo de Bréscia, depois de haver se transladado a Paris, fugiu a Zurich, onde foi acusado de heresia por Bernardo de Claraval; logo foi preso por ordem do imperador Federico Barba roxa, em 1154, e mais tarde enforcado (1155) por ordem do papa Adriano IV, seu corpo queimado e suas cinzas lançadas ao rio Tiber.
Mas no povo foram sendo aceitos as colocações de Arnaldo, até o ponto que os romanos se levantaram em contra do poder secular do papa, e que se proclamasse a República. Não podiam a exaltação papal e a política gregoriana fazer mais que dano na cristandade; e no fundo muitos papas sinceros o reconheciam, como um Eugênio III (1145).

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

9- Latrão I

9
PRIMEIRO CONCÍLIO DO LATRÃO
(IX Ecumênico1, segundo Roma)


*(1) A partir do primeiro concílio de Latrão, reunido em 1123, os concílios não foram considerados autenticamente ecumênicos pela totalidade da cristandade, pois só foram convocados pelo sistema católico romano.
O Concílio de Latrão I, foi convocado pelo papa Calisto II e reunido no ano 1123 na basílica de São João de Latrão, uma das maiores de Roma, para resolver a controvérsia das investiduras, a reforma gregoriana do calendário e as indulgências para os que se alistassem nas cruzadas e a Trégua de Deus. Este concílio decidiu que os bispos católicos fossem nomeados pelo papa romano.

Panorama eclesiástico nos tempos do feudalismo

No décimo século, já a igreja, ou melhor, seu governo nicolaíta, converteu-se na prolongação da sociedade feudal, e os prelados eclesiásticos chegaram a ser nomeados pelos senhores feudais, dentre seus próprios adictos; de onde, bispos, abades e sacerdotes que chegaram a possuir terras, deviam ocupar-se de sua administração. Sem dúvida, homens sem sentimentos religiosos e muito menos vocação, escalam as altas hierarquias eclesiásticas com o único objetivo de usufruir seus múltiplos benefícios. A isto a Palavra de Deus chama de nicolaísmo; isto, e a simonia, ou compra de investiduras eclesiásticas ao suserano por parte de ímpios, impregnaram a cristandade de um espírito mundano sem comparação na história. Mas o curioso é que o feudalismo eclesiástico tinha tido sua origem em Roma e seu sistema papal, com as falsas doações de Constantino, logo as de Pepino o Breve, Carlo-Magno e seus sucessores; de modo que o papa também era um senhor feudal, e tudo o que dispõe de algum poder temporário, defende-o até com o uso das armas, como de fato ocorreu no sistema papal romano. Todo esse incontido deslize de imoralidade e corrupção nas esferas eclesiásticas romanas chegou ao cúmulo durante um período chamado "pornocracia romana", nos tempos da famosa Marozia.
Ainda no começo do nono século, a eleição dos papas era feita pelo clero e a nobreza romana, mas condicionada à ratificação dos imperadores franco-germânicos; este último imposto desde o sínodo romano do ano 898, o famoso "sínodo do cadáver", quando o papa João IX (898-900) reivindicou a memória da tristemente célebre papa Formoso (891-896), cujo cadáver tinha sido desenterrado e julgado pelo papa Estevão VI (896-897); de maneira que foi uma época quando se derramou muito sangue papal devido à ambição dos homens, as intrigas políticas, matando uns com outros para escalar uma tão alta posição eclesiástica; mas o mais triste é que dizem que o fazem no nome do Senhor. Inclusive o próprio João IX e seus sucessores foram considerados como intrusos e lobos rapaces; mas não queremos nos ocupar da lista de mortes sangrentas, a não ser destacar que como os imperadores deviam ratificar a eleição dos papas, chegou a ocasião em que imperadores chegassem a depor papas e a colocar anti-papas em seu lugar, e alguns deles foram assassinados pela nobreza romana, pelo fato de serem estrangeiros, tais como Benedito VI (972-974), imposto pelo imperador Otão, e Clemente II (1046-1047), imposto pelo imperador Henrique II, de quem tinha sido capelão da corte. Os grandes nobres romanos acreditavam ter o direito de escolher o papa.
Durante o reinado de Benedito IX (1033-1045,47), por certo um dos papas mais libertinos da história, houve tanta intriga, que durante certo tempo houve três pontífices rivais simultaneamente, cada um com a ostentação da pretendida legitimidade. Gregório VI (1045-1046), no sínodo de Sutri (no qual foi deposto Silvestre III)
confessou que tinha alcançado a sede romana mediante uma boa soma de dinheiro paga a Benedito IX.
Até nas épocas mais obscuras pelas que tem passado a Igreja de Jesus Cristo, é alentador saber que nem tudo foi tenebroso e corrupto. Embora duvidemos, mas como nos tempos do Elias no Antigo Testamento, também nessa época houve verdadeiros e fiéis servos do Senhor, os quais, embora escondidos e incógnitos, estavam inteirados da amarga situação, e clamavam por uma reforma da Igreja.
A reação para o ascetismo que tinha ocorrido com ocasião do matrimônio da Igreja com o mundo a partir de Constantino o Grande, em um intento por reformar as coisas, volta-se a repetir na Idade Média frente às novas incursões de imoralidade clerical, feudalização das altas hierarquias eclesiásticas, o nicolaísmo e a simonia, em uma laboriosa busca de uma forma perfeita de vida cristã. Houve épocas na história em que as pessoas fugiam do mero nominalismo, pensando que podiam ganhar o céu submetendo-se a disciplinas e rigores religiosos; de modo que se multiplicaram os movimentos monásticos, os quais influíram em algumas mudanças na política papal, em especial o do Cluny, ao norte de Lião, França, cuja escola de pensamento se fez sentir sobre tudo com o Hildebrando, um personagem que decididamente teve muita influência sobre o papado e sobre os concílios papais da Idade Média, quem depois de ser conselheiro de muitos papas, chegou à sede pontifícia com o nome do Gregório VII (1073-1085), e se destacou trabalhando para independentizar à igreja do poder temporal; mas se foi a mão, chegando inclusive a colocar aos reis e senhores feudais sob a autoridade papal.
Hildebrando desdobra uma tortuosa política a fim de impor seu domínio sobre o imperador e todos os príncipes europeus. Gregório VII afirmou que cada homem batizado, pelo mesmo fato de sê-lo, converte-se em um súdito do papa romano durante toda sua vida, queira-o ou não, quem pode castigá-lo por cada pecado inclusive com a pena de morte e confisco de bens. Este ardiloso papa, para levar a cabo tremenda transformação de ordem moral, político, religiosa, doutrinal e ritual, além de sua maquinaria (seus monges clunicenses), pôs a funcionar as famosas Decretais pseudo-isidorianas, base fundamental para a reforma gregoriana, de cujos falsos documentos surgem suas vinte e sete pretendidas afirmações, que se conhecem como "Dictatus papæ", das quais destacamos as seguintes:

2. "Que só o seja dito legitimamente universal
3. "Só ele pode depor ou reabilitar aos bispos".
8. "Só ele pode usar as insígnias imperiais".
9. "Ele é o único homem cujos pés devem beijar todos os príncipes".
11. "O título de Papa pertence só a ele (ao bispo romano)".
12. "lhe é lícito depor aos imperadores".
13. "Nenhum capítulo e nenhum livro tem que se ter por canônico sem sua autoridade".
16. "Nenhum sínodo pode ser chamado geral sem sua autorização".
18. "Uma sentença do papa não pode ser anulada por ninguém, mas sim por ele mesmo".
19. "O papa não pode ser julgado por ninguém".
20. "Ninguém se atreva a condenar ao que recorre à a Santa Sede".
21. "As causas de maior entidade de qualquer igreja têm que levar-se ante o tribunal de dita sede".
22. "A igreja romana não errou jamais nem errará".
26. "que não está em paz com a Igreja romana não será tido por católico".
27. "O papa pode relevar aos súditos do dever de fidelidade aos soberanos perversos".

Julgue o leitor se o que escreve e demanda estas coisas pode ser vigário daquele que, não tendo nenhuma pedra para recostar Sua cabeça, disse: "Sabem que os governantes das nações se assenhoreiam delas, e os que são grandes exercem sobre elas potestade. Mas entre vós não será assim, mas sim o que quiser fazer-se grande entre vós será seu servidor, e o que queira ser o primeiro entre vós será seu servo; como o Filho do Homem não veio para ser servido, a não ser para servir, e para dar sua vida em resgate de muitos" (MT. 20:25-28). É curioso que o ponto dois já tinha sido condenado pelo papa Gregório I (590-604), quem tinha afirmado que quem quer chamar-se a si mesmo sacerdote universal, resulta ser precursor do anticristo, pois se coloca por cima de todos outros.

À medida que se foi abandonando a simplicidade do evangelho, foi difundindo entre a cristandade a crença em superstições, até o ponto de chegar ao convencimento (o qual perdurou até o dia de hoje nos meios católicos romanos) de que mediante a adoração de relíquias e a peregrinação a certos lugares da "Terra Santa" que tinham sido cenários da vida e ministério terrestre de Jesus, poderão ter benefícios espirituais especiais. Foi assim como do século V se iniciaram as peregrinações a Palestina, com o convencimento de que quem morria durante essa viagem, esse fato ganhava o céu; daí as grandes multidões que se dirigiram a Palestina no discorrer dos séculos.
Ao surgir o Islã, e em particular a irrupção dos turcos, essas peregrinações se impossibilitaram. Foi assim como foi impactante e decisivo o chamado às Cruzadas lançado pelo papa Urbano II (1088-1099) (rival e contemporâneo do papa Clemente III) no século XI, o qual foi respondido pelas massas feudais com o famoso "Deus o quer". Com as Cruzadas, o papa, além de resgatar os lugares Santos, obtinha um pretexto para formar uma frente comum contra os muçulmanos e de passagem canalizar o "ardor" religioso e unificar a cristandade ocidental, que na ocasião sangrava em luta fratricida, em um continente "cristão", aonde até o próprio papa romano houve épocas de dispor de um exército regular. Para animar tanto aos príncipes europeus como a suas gentes a que se alistassem a matar a seus semelhantes em nome da verdadeira fé, o papa mesmo se encarregava de arengá-los, lhes prometendo o perdão dos pecados e o céu . De maneira que em Clermont, Urbano II inventou o assunto das indulgências, que tanto dano tem feito à humanidade. Uma síntese de suas arengas pode ser: "Se aqueles que forem à cruzada perdem a vida durante a viagem, na terra ou no mar, ou em alguma batalha contra os pagãos, seus pecados serão perdoados. Concedo-o pelo poder que Deus me deu. A um lado os inimigos de Deus; ao outro seus amigos". É triste registrar que por ordem do suposto representante de Deus, em 1099, Jerusalém foi tomada por estes cruzados, e quase todos seus habitantes foram passados à espada, fossem muçulmanos ou cristãos do Oriente; e os sacerdotes cristãos gregos, coptos e sírios que guardavam os Santos Lugares sofressem horríveis tortura a fim de que revelassem onde se encontrava a verdadeira cruz onde foi crucificado o Senhor.
depois de muitos anos de lutas e intrigas entre os nobres, o imperador e o papado romano, com antipapas a bordo, sobre tudo pelo relacionado com o assunto das investiduras secular dos bispos, duvidosas e até espúrias eleições dos papas e imposição de rivais, por fim, e depois da convocatória de muitos sínodos, foi assinada a paz mediante uma concordata assinada em uma assembléia reunida na cidade de Worms, em 23 de setembro do ano 1123; e para confirmar solenemente esses acordos, o papa francês Calisto II (1119-24) convocou o Concílio de Letrão, reunido em 15 de março de 1123. Ao subir ao pontificado, o papa Calisto II revogou a concessão de investidura laica concedida ao imperador Henrique V, o que tinha originado uma série de disputas, mas já assinado a Concordata, soleniza-se no Concílio.

O concílio

Fazendo um pouco de história registramos que o templo de São João de Letrão é uma das cinco basílicas patriarcais de Roma, construída pelo imperador Constantino no ano 324 junto ao palácio de Letrão da antiga Roma, e que foi de propriedade da família de Constantino, o qual, conforme a falsa "Doação de Constantino", este doou para que fosse a sede do bispo de Roma, o qual se deu durante uns dez séculos.
A partir do presente Concílio ecumênico de Letrão, estas grandes assembléias foram convocadas e controladas pelo papado romano, de maneira que até o Concílio Vaticano II se trata de concílios papais em todo o rigor da palavra. Hildebrando, apoiado nas Decretais pseudo-Isidorianas, acabou com os concílios soberanos, e não é um segredo que os concílios medievais eram meramente uns conselhos, pois quem na verdade legislava era o papa.
No primeiro Concílio de Letrão se ratificaram os documentos da Concordata de Worms. O imperador renunciou ao direito de investidura, reconciliou-se com a igreja e devolveu as regalias expropriadas. A Igreja Católica Romana restaurou sua liberdade para a eleição e consagração de seus prelados. Proibição da simonia e o concubinato dos clérigos.
Foi proibida a intromissão laica nos assuntos eclesiásticos. Tenha-se em conta que nesse tempo já estava bem enraizado o nicolaísmo e a divisão da igreja entre clero e laicos, de maneira que se tinha consolidado a idéia de chamar "igreja" ao sistema dominado pelo clero. Diz a Palavra de Deus que na Igreja do Senhor todos somos sacerdotes.
"4 Chegando-vos para ele, pedra viva, desprezada certamente pelos homens, mas para Deus escolhida e preciosa, 5 vós também como pedras vivas, sede edificados como casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus por meio de Jesu Cristo. 9 Mas vós sois linhagem escolhida, real sacerdócio, nação Santa, povo adquirido Por Deus, para que anunciem as virtudes daquele que lhes chamou das trevas à sua luz admirável" (1 Pedro 2:4-5,9).
A respeito das cruzadas, aprovou-se a remissão de penas temporárias aos que se alistassem para a "guerra Santa contra os infiéis", garantiam-lhe seus bens e família, mas castigavam a quem se negasse a cumprir seus votos de ir resgatar o Santo Sepulcro e outros lugares. Com isto se aprovou um método de "evangelização" muito distante do ordenado pelo Senhor, o Príncipe de Paz, pois a piedade medieval não dependia nem se alimentava da vida do Espírito, verdadeiro vigário de Cristo, mas sim das relíquias impostas pelo sistema de um falso vigário. Tenha-se em conta que a Palestina era o manancial das relíquias, onde supostamente se encontravam os objetos "sagrados" relacionados com o Senhor e Seus mártires.
O partido gregoriano e o espírito cluniacense predominantes neste concílio, estiveram longe de arrumar a rivalidade imperante entre as duas forças que regiam a vida na Idade Média: a Igreja e o Estado, pois as doutrinas gregorianas propugnavam pela supremacia do papado sobre outros poderes. Os leigos não poderão dispor das propriedades eclesiásticas, mas os bispos e o papa seguiriam gozando de seus privilégios e regime feudal, o qual gera novos enfrentamentos posteriores.Com este Concílio se inicia uma nova modalidade canônica: Os cânones conciliares não foram decretados pela assembléia de bispos mas sim pelo papa. Por fim a cristandade ocidental caía inteiramente em mãos do papado romano, e em cujas assembléias "ecumênicas" os bispos eram umas meros bonecos, e a política gregoriana coroava um grande triunfo. O catolicismo romano tinha obtido a completa submissão da autoridade civil à eclesiástica. Ficaria resolvido o consuetudinário enfrentamento entre o papa romano e o imperador?

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

8 - Constantinopla IV

CONCÍLIO DE CONSTANTINOPLA IV
(VIII Ecumênico)



Este oitavo concílio ecumênico foi reunido em Constantinopla no ano 868 - Convocado pelo imperador Basilio; e celebradas suas sessões na basílica da Santa Sofia.

Panorama histórico


Em pleno desenvolvimento do século VIII, já avançada a idade Média, as mudanças políticas na Europa eram muito complexas; afiançou-se o indiscutível domínio papal no Ocidente. devido a que o papado via um perigo no poderio dos lombardos no sul da Itália, o papa Zacarias (741-752), em procura de ajuda e amparo, estreitou relações com o reino dos francos, legitimando a coroação do Pepino o Breve, quem tinha destronado ao último rei da dinastia merovíngia, constituindo-o em protetor de Roma. Breve, e em troca do respaldo recebido, Pepino cedeu ao papado os territórios invadidos do Encharcado grego e a Pentápolis, arrebatados à ocasião aos lombardos, plantando deste modo a semente dos posteriores Estados Pontifícios.
A aliança franco-papal obviamente era mau vista no Oriente, mas isso não foi obstáculo para que em 25 de dezembro do ano 800, o papa Leão III coroasse em Roma a Carlo-Magno, filho primogênito do Pepino o Breve, como Imperador do Ocidente, feito que foi considerado por Bizâncio como uma traição, vendo em Carlos I a um impostor.
Tudo isso ia constituindo fortes raízes para o rompimento entre o Oriente e Ocidente. Recorde-se que com Carlo-Magno o cesaropapismo recebeu uma forte pancada nas costas, se tivermos em conta que ele, apoiando-se no livro "Do Civitate Dei" (A Cidade de Deus), de Agustinho de Hipona, considerava seu Império como um Estado divino, no qual ele era a cabeça.
Da concepção destes poderes, o imperial e o papal, aliados mas no fundo opostos e impulsionados por suas respectivas ambições, desprende-se a variabilidade de sua conflitiva coexistência. Quem manda na cristandade feita Estado? Quem manda no Império, se depois do imperador existe um poder papal que coroa os imperadores do Ocidente?
Os territórios dos Estados Pontifícios foram generosamente alargados com a doação que Carlo-Magno fizesse ao papa Adriano (772-795), aumentando a hegemonia papal sobre o Ocidente do continente europeu. quanto mais incrementava o papa romano seu poder temporário e jurisdicional, quanto mais minguava seu caráter espiritual, pois era tanta a desorientação reinante e o desconhecimento da economia de Deus, que a vida religiosa chegou a ser controlada pelo poder civil, e a nomeação de arcebispos por parte de Carlo-Magno e seus sucessores degenerou em que surgissem Igrejas feudais e arcebispais.
Daí que os bispos começaram a procurar a maneira de sacudir-se daquelas ingerências seculares, e apelaram a Roma; mas se tropeçaram com que ainda no século IX Roma carecia dos instrumentos jurídicos adequados para respaldar essa posição, pois ainda não estava clara a jurisdição de Roma sobre as demais Igrejas do Império.
Mas os gênios do romanismo resolveram remediar isso inventando uns falsos documentos chamados historicamente "Fraudes pios" ou "Doações pias", ou "Pseudo-decretais" chamadas isidorianas, dentro dos quais se encontrava a "Doação do Constantino"*(1), por meio dos quais o papa romano tinha perpétuo direito sobre a cidade de Roma e todas as províncias, distritos e cidades da Itália e do Ocidente.
*(1) Remeto ao leitor a meu livro "A Igreja de Jesus Cristo, uma perspectiva histórico profética", capítulo IV, Tiatira. Ali encontrará mais ampla informação sobre as famosas fraudes pios.
O objetivo principal destas fábulas tidas por documentos autênticos, era assegurar a posição dos bispos e do clero, guardando-os da intromissão dos laicos; mas os próprios bispos que tinham apelado a Roma e tinham aceito as fraudes pios, tarde já se deram conta que tinham sido vítimas de seu próprio invento, pois o terrível jugo imposto por Roma, resultou pior que o dos reis e príncipes feudais.*(2)
*(2) O poeta italiano lhe Dante Alighieri, mesmo desconhecendo a falsidade destes documentos, diz em seu famoso livro A Divina Comédia, "Inferno", canto XIX: "Ah, Constantino! A quantos males deu origem, não sua conversão ao cristianismo, a não ser a doação que de ti recebeu o primeiro papa que foi rico!"

Estes bispos ignoravam o poder absoluto dos papas, o qual achou legitimação nas falsas Decretais, estabelecendo-se definitivamente a supremacia espiritual e temporal dos papas sobre todos os bispos e governantes seculares da cristandade, convertendo-se assim Roma no verdadeiro centro da cristandade medieval.

Antecedentes


A imperatriz Teodora, na ocasião regente de seu filho Miguel III, nomeou a Ignácio como patriarca de Constantinopla; mas a integridade moral deste me chocava com as manobras e a conduta dos cortesãos, em especial com Bardas, o desenfreado tio do monarca, a quem Ignácio negou a comunhão, sucesso pelo qual foi destituído o patriarca no ano 858, e substituído por Fócio, um nobre elevado à fila patriarcal do cargo civil de chanceler imperial; para o qual, em uma semana escalou todos os cargos hierárquicos eclesiásticos. Como conseqüência se dividiu o clero bizantino entre partidários de Ignácio e partidários de Fócio, com as sabidas perseguições e destituições dos bispos amigos de Ignácio, circunstância que levou a reunir um sínodo em Constantinopla no ano 861, a fim de esclarecer as coisas, ao qual assistiram representantes do bispo de Roma.
Embora Fócio teve eventualmente o apoio romano para permanecer no cargo, entretanto tinha muito presente que devia encarar-se com as pretensões do papado. Para esse tempo as rivalidades entre Roma e Bizâncio, com suas poderosas e atrativas influências religiosas, rituais e políticas, já pareciam irreconciliáveis. Fócio foi repudiado e condenado pelo papa Nicolau I (858-867) e um sínodo romano do ano 863, papa que apelava às falsas Decretais Isidorianas para impor sua soberana vontade. O imperador seguia respaldando a Fócio, e a sua vez convocaram um sínodo em Constantinopla no ano 867, que sob a presidência de Fócio, condenou a Nicolau I, acusando-o sobre tudo de falsificação do credo niceno, aduzindo que os latinos tinham introduzido no Credo a palavra "Filioque" (e do Filho), no sentido de que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho.
Mas as coisas deram uma volta em Bizâncio, pois Fócio, já sem seus amigos mais influentes na corte, viu-se obrigado a renunciar devido a que emerge Basílio o Macedônio (867-886) e chega ao poder imperial após assassinar a Bardas e mais tarde a Miguel III, voltando Ignácio à sede patriarcal.

O concílio

Basilio, o novo imperador, ficou de acordo com o novo papa, Adriano II (867-872), a fim de convocar um concílio, mas com a condição papal de que os legados romanos presidissem as sessões; mas o mais grave do assunto foi que o papa exigiu que toda a assembléia conciliar assinasse um escrito dele, o "Liber satisfaccionis", o qual confirmava o primado da sede romana.
Com escassa assistência, este concílio iniciou suas reuniões em 5 de outubro do 868 até em 28 de fevereiro do seguinte ano, na basílica Hagia Sophía (Santa Sofia). Seus principais acordos se podem resumir nos seguintes:
- Foi condenado Fócio, em sua presença.
- À tradição eclesiástica e ditos patrísticos foi concedido a mesma autoridade que a Palavra de Deus transmitida pelos Apóstolos.
- Foi ratificada a legitimidade do anti-bíblico culto às imagens, anatematizando ao que não o fizesse.
- Este concílio definiu que nenhum capitalista do mundo removesse de sua sede aos patriarcas, principalmente ao papa romano, e seguindo a ordem, aos de Constantinopla, Alexandria, Antioquia e Jerusalém.
- Estabelece, no cânon 21, a superioridade do concílio sobre o papa.
Como vemos, a convocatória, desenvolvimento e acordos deste concílio têm um transfundo eminentemente secular. O homem, ao apartar-se cada dia mais de Deus, por muito eclesiástico que seja, como muito representante de Deus que pretenda ser, atua impulsionado por sua natureza caída; e daí que, sem a intervenção da vontade de Deus e muito longe dos princípios bíblicos, nomeiem e condenem muitas vezes a um patriarca Fócio, tenham a autoridade da Palavra de Deus ao mesmo tempo que os ditos e tradições dos homens, se esquecem de adorar a Deus e obriguem a outros sob anátema a adorar às imagens, e cuidem de que ninguém os deponha de seus elevados postos, cargos de linhagem inventados pelos próprios homens.
Pela Palavra de Deus, sabemos que o Senhor aborrece o nicolaísmo. "Mas tem isto, que aborrece as obras dos nicolaítas, as quais eu também aborreço". Diz à igreja em Éfeso em Apocalipse 2:6, quando os nicolaítas começavam a obrar, mas logo vemos no versículo 15, que essas práticas se converteram em doutrina, e o Senhor diz à igreja em Pérgamo: "E também tem aos que retêm a doutrina dos nicolaítas, a que eu aborreço". Infelizmente o nicolaísmo continuou até nossos dias e se tornou um câncer na cristandade moderna.

Rompimento entre o Oriente e Ocidente


Apesar de ter sido anatematizado, Fócio obteve a amizade com o novo imperador e com o Ignácio, a quem aconteceu na sede patriarcal de Constantinopla depois da morte deste em 877; e para que sua pessoa fosse totalmente reivindicada, convocou um novo sínodo em Constantinopla. O papa João VIII (872-882), enviou representantes a este sínodo, e reconheceu a Fócio, em troca de que os missionários bizantinos abandonassem a Bulgária em favor dos de Roma.
Este sínodo reconheceu a Fócio como legítimo patriarca bizantino. Os legados papais repudiaram a atitude que tinha tomado o anterior papa Adriano II respeito de Fócio; mas se iniciou um irreversível divórcio entre a cristandade oriental e a ocidental, mais se se tem em conta que as "Decretais pseudo-isidorianas" foram impugnadas no Oriente desde um princípio. depois disso seguiu um possante desenvolvimento da cristandade oriental com sua expansão na Bulgária, Rússia, os países Bálticos, e até no sul da Itália, frente a uma cristandade latina temporalmente adoecida, devido ao embate dos muçulmanos e a debilidade de seu aliado, o império carolíngio dos francos; de maneira que sobreveio a ruptura formal entre Roma e Constantinopla já entrado o século XI.
Todas essas rivalidades e ciúmes se consolidaram nos tempos do papa Leão IX (1048-1054), enquanto que no Oriente o patriarca era Miguel Cerulário, quem se opôs a Roma. Por um lado o papa ataca os costumes do clero oriental, sobre tudo porque se casavam, em tanto que Cerulário era um ciumento defensor da liberdade da Igreja, tanto frente ao Estado como do papado romano. Isto lhe valeu o desterro e a morte. além das que viemos insistindo ao longo dos capítulos anteriores, as causas da ruptura total e definitiva das cristandades bizantina e a latina, não obedecem histórica e teologicamente a causas fundamentais, de peso, a não ser a rudimentares pareceres e nimiedades, tais como que o clero ocidental se fazia a barba e os popes orientais não, assuntos sobre o dia de jejum, o comer certas carnes, o uso do pão ázimo na eucaristia, e outras coisas pelo estilo.
Como Cerulário se negasse a aceitar o primado romano, apoiado na espúria "Doação de Constantino", o papa Leão IX enviou a Constantinopla uma bula de excomunhão, a qual foi colocada no altar da Basílica da Santa Sofia, em 16 de julho do ano 1054. Com este gesto, Roma renuncia a até aí verdadeira expressão de catolicidade da Igreja, e inaugura a época de catolicidade romana. Como resposta, Miguel Cerulário e com ele a cristandade oriental, ao ano seguinte celebraram um sínodo que se encarregou de excomungar a sua vez ao papa Leão IX; e cada uma dessas facções da cristandade mutuamente se seguiram considerando cismáticas. Tenha-se em conta que Miguel Cerulário também abrigava sérias aspirações de um papado oriental. Essa mútua excomunhão desses líderes do catolicismo romano e a ortodoxia oriental protocolizou o que historicamente se conhece como o Cisma do Oriente, divisão que perdura até hoje, e que causou até derramamento de sangue.

Outras conseqüências

Pese a todas as dificuldades, controvérsias, enganos e baixezas, até aqui se havia buscado o entendimento e a unanimidade no reconhecimento dos concílios ecumênicos que de algum jeito expressavam a vida da Igreja universal antiga. Depois do rompimento definitivo, já em plena Idade Média, Roma só tem como ecumênicos seus próprios sínodos; de maneira que os que se seguem os continuamos comentando com essa condição, devido a que revestem especial interesse pelo processo geral de corrupção da verdade evangélica, e pelo desenvolvimento da cristandade ocidental que corresponde a todos. A palavra profética na própria Bíblia nos descreve como se prostituiu o povo de Deus com os gentis, e vemos na história como Deus começa a trabalhar para restaurar a Sua Igreja a partir da Reforma. Todos os concílios tidos por Roma como ecumênicos repercutem até dentro do protestantismo, e ao analisá-los se esclarecem as raízes, causas e origens de muitas das práticas que o povo tem como autênticas de Deus, dentro e fora do catolicismo romano.
Por outra parte, nos momentos atuais o processo de restauração da Igreja bíblica transcende os limites do protestantismo histórico, pois este não alcançou a encher as expectativas bíblicas da autêntica Igreja do Senhor Jesus Cristo; de maneira que foi apenas um elo. Faz já quase duas centúrias que o Senhor tirou do protestantismo um cristianismo de vanguarda, que expressa a autêntica comunhão e unidade do Corpo de Cristo, onde só Ele é a Cabeça.
Note-se que até aqui, todos os concílios ecumênicos foram realizados no Oriente, cuja cristandade quer ser a guardiã da fé antiga, a ortodoxa; não assim Roma, cheia de cartas e escritos papais, com suas falsas decretais a bordo, que deram ao papado as bases canônicas para erguer-se durante séculos sobre toda a cristandade ocidental; de maneira que seguimos falando do desenvolvimento de uma cristandade no cativeiro babilônico, onde tudo estava impregnado do romano, da qual Deus seguiu trabalhando para tirar sua Igreja do cativeiro.
Então a partir daqui entramos plenamente no período católico romano, pois Roma, livre já de toda crítica e oposição, com um respaldo político diferente do imperador de Constantinopla, como é o dos imperadores carolíngios dos francos, encontrava-se já em pleno poder e faculdade para desenvolver uma monarquia universal do papado romano. Agora a cristandade ocidental perde seu sentido católico, girando para o romano. Com o tempo no Ocidente se confunde o católico com o romano, e tudo deve girar ao redor de um personagem que, entre seu muitos títulos, adotou-se o de "Vigário de Cristo", e as pessoas crêem, pois nessa época, muito mais que agora, ignorava-se em geral o conteúdo bíblico do evangelho e muito pouco se sabia da pessoa do Senhor Jesus, de Sua obra, de Seu ministério, pelo que tem feito por nós, de que o verdadeiro Vigário de Cristo é o Espírito Santo. Mas o Senhor esteve trabalhando incansavelmente para restaurar as coisas. A construção da casa do Senhor seguiu seu curso; e oportunamente o Senhor começou a levantar apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres, que edificassem aos Santos "para a obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo".

sábado, 8 de agosto de 2009

7- Nicéia II

7
SEGUNDO CONCÍLIO DE NICÉIA
(VII Ecumênico)



Este sétimo concílio ecumênico foi reunido em Nicéia no ano 787 - Convocado por Irene, a imperatriz regente. Sancionou o culto às imagens; ou seja, declarou a legitimidade de dar reverência a quadros e imagens que representassem realidades divinas.

Antecedentes

Ao começo do século VIII, significou uma época crucial para o Império Bizantino, pela abrupta irrupção dos exércitos muçulmanos; mas quando estes assediavam nas próprias portas de Constantinopla; sobe ao poder imperial Leão III (717-740), da dinastia isáurica, salvando assim à capital do império, devolvendo a Este o prestígio perdido, e reconquistando muitos territórios que tinham sido tomados pelos árabes. Este mesmo impulso reconquistador foi retomado por seu sucessor Constantino V (740-775), quem chegou até as mesmas margens do rio Eufrates, nos limites das antigas terras mesopotâmicas.

Pelas atas do concílio da Elvira (Espanha), sabe-se que o cristianismo antigo, pós primitivo, era adverso ao culto e adoração às imagens religiosas, mas ante a decadência da cristandade a partir de Constantino o Grande, se foi introduzindo esse costume devido à influência pagã; mas como resultado das invasões e da influência dos muçulmanos, ao parecer inimigos da idolatria, surgiu um movimento iconoclasta, e foi quando o imperador Leão III, oriundo da Anatólia, menos dado à idolatria que os gregos, compreendeu o justo das brincadeiras dos infiéis, e dentro do pacote de suas reformas imperiais, introduziu a proibição do culto das imagens no ano 730, e aquilo durou por mais de um século, situação conhecida na história como a controvérsia das imagens. Terá que reconhecer que o cristianismo gradualmente se foi transformando, de tal maneira que seus elementos originais já na idade Média era difícil reconhecê-los; e não é de sentir saudades que, por exemplo, o genuíno arrependimento chegasse a degenerar-se em penitência, a ceia do Senhor, converteu-se em um sacrifício expiatório devotado por um sacerdote terrestre, com o estranho poder de salvar a vivos e a mortos, rito que até hoje chamam missa, termo do latim, que significa reunião. Então, imagine o leitor aquela situação.

Maomé, o originador do islamismo tinha conhecido os textos do Antigo Testamento; ele sabia que era descendente de Abraão pela linhagem de Ismael, ele conhecia os textos de Moisés incluído o Decálogo onde está proibida a idolatria; pela leitura do Novo Testamento, Maomé sabia a respeito de Jesus de Nazaré, e estava contra a adoração das imagens, e seus seguidores se encontram um cristianismo decadente e idolátrico, o qual sem dúvida é o alvo das brincadeiras do islamismo. A tal ponto conhecia Maomé a Bíblia, que para ele a revelação de Deus no mundo é progressiva e reconhece seis fases ou graus nela: Adão, Noé, Abraão, Moisés, Jesus e, é obvio, Maomé. É inegável que os árabes tinham sido idólatras antes do islamismo. A Meca, antes do advento da religião iniciada por Maomé, era um verdadeiro panteão de divindades árabes, mas ao surgir o Corão, o islamismo consolidou a adoração só a Alá, que eles por tradição desde antigo já conheciam como o pai de todos os deuses, e a quem os peregrinos já vinham adorando em uma pedra negra que era guardada dentro de um edifício, a Caaba. Mas, o que diz a Palavra de Deus? Diz em Êxodo 20:3-6:

"3 Não terá deuses alheios diante de mim. 4 Não te fará imagem, nem nenhuma semelhança do que está acima no céu, nem abaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. 5Não se inclinarás a elas, nem as honrará; porque eu sou Jeová seu Deus, forte, ciumento, que visito a maldade dos pais sobre os filhos até a terceira e quarta geração dos que me aborrecem, 6 e faço misericórdia a milhares, aos que me amam e guardam meus mandamentos".

"Não farão para vós ídolos, nem escultura, nem porão em sua terra pedra grafite para lhes inclinar a ela; porque eu sou Jeová seu Deus" (Levítico 26:1).

"15 Guardai, pois, muito suas almas; pois nenhuma figura viram o dia que Jeová falou convosco no meio do fogo; 16 para que não lhes corrompam e façam para vós escultura, imagem de figura alguma, efígie de varão ou fêmea, 17figura de animal algum que está na terra, figura de ave alguma alada que voe pelo ar, 18figura de nenhum animal que se arraste sobre a terra, figura de peixe algum que haja na água debaixo da terra. 19Não seja que eleve seus olhos ao céu, e vendo o sol e a lua e as estrelas, e todo o exército do céu, seja impulsionado, e incline a eles e lhes sirva; porque Jeová seu Deus os concedeu a todos os povos debaixo de todos os céus" (Deuteronômio 4:15-19).

"portanto, amados meus, fujam da idolatria" (1 CO. 10:14).

Como é de supor, a política religiosa do imperador Leão III teve seus opositores, em especial entre os monges, dados como eram às representações religiosas (ídolos e imagens), e com eles o povo supersticioso e quase pagão. Um desses monges que liderava essa oposição foi João Damasceno, quem escreveu três apologias em favor do culto das imagens, aonde, por exemplo se podem ler as seguintes palavras: "Não corresponde ao Imperador fazer leis para reger à Igreja. Os apóstolos pregaram o evangelho; o monarca deve cuidar do bem-estar do Estado; os pastores e mestres se ocupam da Igreja". É certo o que escreve aqui o monge; mas, a Igreja mesma, ao aceitar a união com o Estado, não perdeu o direito de usar este argumento?
Apesar de tudo isto, o imperador seguiu sua política iconoclasta, e seus soldados destruíram toda sorte de esculturas e quadros, coisa que também serve de pretexto para frear o crescente poder dos ricos monastérios, e sujeitar à Igreja sob o poder do Imperador. A isto seguiram as lutas opositoras tanto de monges como do desorientado povo e até pelo mesmo patriarca Germano de Constantinopla. Muitos deles foram executados, deposto o patriarca iconólatra e substituído pelo iconoclasta Atanásio. Em Roma, o papa Gregório III (731-741) em oposição à política do imperador, convocou um sínodo romano no ano 731 ao que assistiram 93 bispos, decretando que em diante o que destruísse ou injuriasse imagens de Cristo, de Maria ou dos apóstolos e demais Santos seria excomungado.
Constantino V (741-775) sucedeu a seu pai Leão III no trono imperial, e em seu zelo iconoclasta convocou um concílio em Hieréia no ano 754, com a assistência de 300 bispos, quem apoiado nas Escrituras e a tradição patrística, condenaram o culto às imagens, deixando por sentado que os únicos símbolos do culto cristão se acham representados no pão e o vinho da ceia do Senhor, e de passagem denunciaram a tendência ariana ou nestoriana que implicava representar só a natureza humana de Jesus Cristo. devido a que isto encontrou forte oposição em Roma e o posterior triunfo da iconolatria no segundo concílio de Nicéia, este concílio da Hieréia não teve aceitação ecumênica. Como conseqüência dos decretos imperiais e a imposição à força dos acordos do concílio de Hieréia, os templos e monastérios do Império foram despojados de imagens e ícones, às vezes com o uso da violência. A verdade é que a um idólatra não lhe libera da idolatria lhe arrebatando e lhe destruindo seus ídolos; isso traz conseqüências adversas. Essa sanidade deve começar no coração, que em última instância é de onde sai toda a maldade, e esse trabalho de substituição da adoração aos ídolos pela adoração ao Deus vivo, só o faz o Senhor mediante Seu Espírito e pela obra de Seu Filho Jesus Cristo.
A política do imperador Leão IV (775-780), filho e sucessor de Constantino V, foi de mais tolerância, acredita-se que pela influência de sua esposa Irene, quem se inclinava para a adoração de ícones. À morte do imperador Leão IV no ano 780, Irene, sua viúva, teve a oportunidade de governar em qualidade de regente no trono de seu filho menor Constantino VI (780-797).

O concílio

Irene destituiu ao patriarca de Constantinopla e em seu lugar elevou a Tarásio ao patriarcado, quem vinha desempenhando-se como oficial civil; de maneira que teve que fazer os votos monásticos e ser ordenado sacerdote antes de ser eleito para ocupar a vacância no patriarcado. Com um patriarca surto dessa maneira, Irene bem podia empreender a restauração do culto das imagens no Império; e para isso decidiram convocar um concílio em Constantinopla em 786, mas encontraram a férrea oposição da guarda imperial, quem conseguiu dissolver a assembléia reunida na Basílica dos Apóstolos. Para livrar-se dessa oposição, teve que depurar o exército, e conseguiu inaugurar o concílio em 24 de setembro do ano 787, mas na cidade de Nicéia, aonde os bispos iconoclastas não tiveram representação. O papa romano Adriano I (772-795) não assistiu a este concílio, mas mandou seus legados, e a assembléia se considerou pelo sistema católico romano como o sétimo concílio ecumênico. O número de bispos assistentes superava os trezentos e cinqüenta.
Em substituição do imperador, foi Tarásio quem presidiu as reuniões do concílio, interessando-se por normalizar as relações entre essa facção da igreja e o Estado, a fim de que o patriarcado fosse reconhecido como autoridade suprema no relacionado com os dogmas, além de que se concedesse ao imperador autoridade tanto no relacionado com as leis eclesiásticas como na administração.

Restauração do culto à imagens

O segundo concílio da Nicéia tinha como objetivo anular as decisões do sínodo da Hieréia e condenar todos os decretos iconoclastas; estabeleceu o culto das imagens, aprovou o uso dos ícones, fomentou a idolatria e a superstição. Deste modo proibiu a nomeação de bispos pelo poder laico. Para justificar a adoração das imagens, os bispos conciliares pretextaram, entre outras coisas, que a Escritura era insuficiente a respeito. Este concílio condenou, acusando-os de "sacrílegos hereges", a todos os que consideravam as imagens "cristãs" como simples ídolos, e estabeleceu, bizantina e sutilmente, a enganação de que a Deus se rende culto de "latría", e aos Santos de "dulía"*(1).
* (1) Palavra tirava do verbo grego "douleno", servir

Conseqüências

Apesar de que Roma tinha avalizado as decisões aprovadas em Nicéia, o que seguiu foi que o aprovado por este concílio não teve imediata aceitação universal, pois muitos setores eclesiásticos do Oriente continuavam aderidos a suas convicções iconoclastas, e Ocidente se levantou contra a veneração de imagens. No Ocidente os papas tinham aprovado o uso de ícones, mas havia setores que, embora admitindo as imagens, negavam-se às venerar, reprovando as decisões do Concílio da Nicéia. Assim continuou por algum tempo a resistência entre os favorecedores dos ícones e imagens, por uma parte, e os iconoclastas, pela outra.
Carlos Magno (742-814), primeiro imperador do restaurado Império Romano do Ocidente, opôs-se às decisões do concílio de Nicéia em um escrito teológico, "Libri Carolini". Incidentalmente um sínodo ou anti-concilio reunido em Frankfurt e convocado pelo imperador Carlos Magno em 794, com a assistência de trezentos bispos ocidentais, incluídos dois representantes papais, condenou o decreto do concílio de Nicéia de 787 pelo qual permitiam coletar reverência às imagens, considerando de passagem dita assembléia não como um concílio ecumênico, a não ser simplesmente como uma reunião dos bispos gregos. Este sínodo pediu ao papa Adriano I que excomungasse aos bispos participantes em Nicéia, mas o papa soslaiou o assunto enredando-o tudo com sutis distinções entre "veneração" e "adoração". Diz em Mateus 16:24:
"Então Jesus disse a seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome sua cruz, e me siga".
No versículo anterior a Escritura fala de levar a cruz, não de adorá-la. Na prática religiosa, quem costuma adorar a cruz, é inimigo de levá-la para morte do ego carnal. Mas não se trata da religiosa costume de carregar uma cruz metálica ou de madeira pendurada no peito. A cruz de Cristo não é ostentação de algo objetivo, a não ser a obediência subjetiva, e a morte ao mundo, ao pecado, à carne e ao eu. Mas ao final, Roma terminou impondo toda sorte de idolatria e superstição, porque seu destino era converter-se na grande prostituta.
Como nesses tempos a região nortenha da Itália ainda não tinha acatado a hegemonia papal, é meritório de se mencionar que na época carolíngia, Luis o Piedoso, sucessor de Carlos Magno, nomeou bispo de Turim ao espanhol Claudio (morreu em 839), famoso pregador, quem reprovou energicamente a veneração de ídolos, da cruz e a prática de solicitar a intercessão dos Santos; enfatizava a importância da devoção espiritual e a consagração pessoal a Deus. Crítico acérrimo da instituição papal, declarou que não deve ser chamado apostólico o que se sinta na suposta cadeira do apóstolo, a não ser o que faz a obra de um apóstolo. Em toda essa região do Piamonte perduraram testemunhas fiéis da ortodoxia bíblica, sem que se poluíssem de idolatria nem de papismo, virtuosa semente que ia germinando até que séculos mais tarde esta verdade entroncara com o movimento dos sofridos valdenses.depois de Irene, em Bizâncio houve imperadores que condenaram a idolatria, mas ressurgiu definitivamente com a Teodora, a esposa do imperador Teófilo, mulher idólatra que à morte de seu marido (ano 842) governou como regente de seu filho Miguel III (842-867), à maturação menor de idade. Então, como resultado da aceitação tanto em Oriente com o culto às imagens em quadros ou ícones, como no Ocidente com o culto às imagens esculpidas, as relíquias religiosas, a cruz, e outros objetos de duvidosa origem, o segundo concílio de Nicéia adquiriu o caráter de ecumênico. Este concílio também se destaca pela promulgação da «tradição» eclesiástica como autoridade, pondo sob anátema ao que a rechaçasse; assunto que completou o contra-reformador concílio de Trento oito séculos mais tarde.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

6- Constantinopla III

6

TERCEIRO CONCÍLIO DE CONSTANTINOPLA

(VI Ecumênico)


Celebrado mediante duas convocatórias: A primeira no ano 680-681, pelo imperador Constantino IV Pogonato, quem convidou ao papa Agatão a que enviasse seus legados; a segunda convocada pelo imperador Justiniano II no ano 692. debateu-se sobre a doutrina das duas vontades em Cristo e Suas duas naturezas, condenando o monoenergismo ou monotelismo. A conclusão foi que Cristo tinha duas vontades, existindo uma perfeita harmonia entre ambas. Sua vontade humana estava sempre em sujeição a Sua vontade divina. Suas sessões foram levadas a cabo na cidade de Constantinopla, a Nova Roma.


Antecedentes
No século VII o cristianismo atravessava uma crise decadente devido a uma relaxação moral e espiritual da maior parte do povo cristão. A Igreja estava sofrendo uma preocupante debilidade; em qualquer parte reinava uma frieza devida a que a fé nas pessoas era só nominal; o clero e os monges davam um pobre testemunho de vida, e já começava muita da desorientação e ignorância que caracterizou aos crentes da Idade Média.
A começos do século VII se fechou a era histórica do mundo antigo e alvorecia a idade Média com seu obscurantismo nas costas, e ainda persistia o engano monofisita em torno das duas naturezas de Cristo, pois muitos bispos orientais seguiam defendendo esta doutrina, sem que muitos outros deixassem de ser simpatizantes. Os imperadores bizantinos tinham feito falidos intentos por reconciliar aos ortodoxos com os monofisitas, e uma vez mais o intentou o imperador Heráclio (610-641) por sugestão de Sérgio, patriarca de Constantinopla (610-638), achando para isto apóio em certos escritos atribuidos a Dionísio o Areopagita, o qual havia dito que Cristo obrava ações divinas e humanas por uma só energéia.
Sergio, tratando de solucionar o conflito divisor propõe uma "bizantina" fórmula que ao final não foi mais que uma nova heresia, pois pediu suspender esta controvérsia sobre se Cristo obrava por meio de uma ou mais energéia. Sergio propôs que todos estivessem de acordo em que no Verbo encarnado havia duas naturezas, mas uma só operação e uma só vontade (thélema) divino-humana, que ele denominava "única energia natural divino-humana", ao qual lhe chamou "monotelismo", de monos, um, sozinho, sem companhia, e thélein, querer, escolher, atuar por vontade; quer dizer, um só querer, uma só vontade. Em outras palavras, Sergio queria conjugar duas afirmações pretendidamente complementares: Cristo possui uma só energia (agradando aos monofisitas) e dupla natureza (agradando aos partidários da Calcedônia); daqui que lhe desse também o nome de monoenergismo. No ano 633 se proibiu falar de uma ou de duas energias em Cristo; não obstante, Sergio manteve sua terminante oposição às duas energias, por acreditar que isso exigia atribuir a Cristo duas vontades apostas entre si. Em princípio, Sergio teve um relativo êxito em seus propósitos, pois obteve a reconciliação de muitos bispos orientais, e de passagem obteve a aprovação papal no pouco versado Honório I (625-638), quem por escrito esteve de acordo com os pontos de vista heréticos de Sergio; também obteve a aprovação do imperador Heráclio, quem oficializou ao monotelismo mediante decreto imperial, e esta controvérsia seguia seu curso interminável.
Apesar de que esta heresia tinha sido elevada à categoria de doutrina oficial do Estado, o monotelismo logo encontrou seus decididos opositores tais como Sofrônio, bispo de Jerusalém, e muitos partidários dos anteriores concílios ecumênicos, em especial o da Calcedônia.
Paulo, o sucessor de Sergio no patriarcado de Constantinopla, vendo que longe de unir, o monotelismo tinha dividido mais a cristandade, teve a decisão de suspender
as discussões a respeito da vontade de Cristo, o qual registrou no documento chamado "Typus", que foi convertido em decreto imperial por Constante II (641-668). Em Roma, Martinho I (649-655), o sucessor do Honório no papado, condenou o monotelismo em um sínodo de 105 bispos reunido no Latrão no ano 649, declarando-se a favor das duas energias ou vontades em Cristo, condenando a Sergio e pronunciando-se contra os decretos imperiais dos anos 638 e 648. Essa ousadia, por ordem do Imperador Constante II, custou-lhe o desterro e sua posterior morte em Crimea, por causa dos maus tratos de que foi vítima.
O mais conspícuo, atrevido e competente oponente à heresia do monotelismo foi o monge Máximo o Confessor (580-662), discípulo do Sofrônio e considerado o mais destacado teólogo grego do século VII, quem por esta causa, e também por ordem do Imperador Constante II, sofreu o cárcere, a mutilação da língua e da mão direita e posterior desterro, a fim de que não seguisse falando ou escrevendo sobre este proibido tema. Ele era oriundo de Hasfin, Palestina, localidade sobre o Golan, no Tiberias. Entre outras coisas, ele tinha escrito em 642 no Opúsculo 7: Exposição doutrinal remetida ao Chipre, para o diácono Marinho, o seguinte:
«Por conseguinte, aceitando a doutrina dos Santos pais, recusamos qualquer diminuição na vontade, nas operações naturais e na natureza mesma do só e único Verbo de Deus feito homem e Cremos que Ele mesmo é, ao mesmo tempo, em todos os aspectos, perfeito Deus e perfeito homem, pois possui por natureza e de modo perfeito todas as características próprias das naturezas divina e humana, suas vontades e operações. Desta sorte evitamos que, pela subtração de alguma das propriedades que definem a uma ou outra dessas duas naturezas, cheguemos não só a diminuir a realidade de cada uma das duas partes nas que e às que subsiste, a não ser inclusive à completa eliminação de ambas ou de alguma delas. E que tinha uma verdadeira vontade humana, como cumpre a sua natureza, ao igual a possui uma vontade divina por sua essência, o manifesta o próprio Verbo com aquela muito humana súplica com a que rogava ser sacado da morte e que fez em favor de nossa salvação, dizendo: "Pai, se for possível, afasta de mim este cálice". Revelava deste modo a debilidade de sua carne e que sua manifestação na carne não era uma fantasia que enganasse a quem a via, fazendo errar seus sentidos. Mas sim realmente era homem, como o prova sua vontade natural, da que emanou essa súplica de liberação, segundo o projeto da salvação».*(1)
(1) Máximo o Confessor. Meditações sobre a agonia de Jesus. Editorial Cidade Nova. 1990. Pág. 28.

O concílio

Assim estavam as coisas quando é entronizado um novo imperador bizantino, Constantino IV (668-685), quem via a necessidade de restabelecer a harmonia eclesiástica e o fortalecimento político no império, convocando um novo concílio ecumênico, inclinando-se na ocasião a favor da corrente da Calcedônia. É bom anotar que para essa época, muitas províncias do antigo império romano bizantino tinham sido invadidas, não só pelos bárbaros, mas também também pelos árabes muçulmanos, de maneira que os principais bispados monofisitas estavam em mão dos árabes islâmicos; de modo que a controvérsia monofisita estava quase que eliminada..


«Trullanum Primun»

O Terceiro Concílio Ecumênico de Constantinopla foi inaugurado em 7 de novembro do ano 680, e duraram as reuniões até em 16 de setembro do seguinte ano. Muitos historiadores designam este concilio com o nome de "Trullanum Primun" devido a que se realizaram suas sessões na cúpula do palácio imperial, chamada "Trullo". A suas reuniões assistiram 174 bispos orientais e oito emissários ocidentais, os quais levaram um documento escrito do sínodo romano, defendendo a mesma posição que tinha tomado Martinho I, e que lhe havia custado o desterro e a morte.
Apesar da entristecedora maioria oriental, foi presidido o concílio pelos legados romanos junto com o imperador. Nas três primeiras sessões, de um total de vinte e dois, foram lidas as atas dos concílios ecumênicos de Éfeso, Calcedônia e Constantinopla II; nas seguintes se baralharam os textos dos chamados antigos pais, tanto por parte dos monotelitas como pelos ortodoxos.
Este concílio condenou definitivamente o monotelismo, que afirmava a existência em Cristo de uma única vontade, anulando de passagem os decretos imperiais de Heráclio e Constante II. Deste modo foi excomungado Macário, patriarca da Antioquia, principal defensor da heresia monotelita. Como autores e propagadores da heresia foram condenados post mortem, entre outros, Sergio, patriarca de Constantinopla, Paulo e Pedro de Constantinopla. Não obstante que este concílio era presidido por legados papais, foi excomungado o papa Honório I, e seu nome eliminado da lista dos bispos, declarando-o herege, o mesmo que ao patriarca Sergio. A todos eles os apelidaram de instrumentos do diabo, e os anatematizaram.
O concílio se declarou claramente em favor de duas vontades e duas energias existentes em Cristo, como "concorrentes mas mutuamente nele para a salvação da raça humana". Conciliando a doutrina dos cinco concílios precedentes, neste concílio fica fixada a doutrina cristológica: deixou-se por certo que posto que Jesus Cristo era verdadeiro Deus como também verdadeiro homem, tinha que ter, na unidade de pessoa, duas naturezas, uma divina e outra humana, com duas vontades correspondentes a cada uma de suas naturezas. Desta maneira este concílio deu por terminado o prolongado debate que durante muitos séculos se sustentou sobre a relação de Jesus Cristo com Deus e sobre a maneira em que tinham que achar-se no Senhor Jesus o divino e o humano. O anterior foi consignado na seguinte fórmula de fé:"Cremos que é um da Santa Trindade, ainda depois da encarnação, nosso Senhor Jesus Cristo, nosso verdadeiro Deus, dizemos que suas duas naturezas resplandecem em sua única hipóstasis, em que mostrou tanto seus milagres como seus padecimentos, durante toda sua vida redentora, não na aparência, a não ser realmente; posto que em uma só hipóstasis se reconhece a natural diferença por querer e obrar, com comunicação da outra, cada natureza o seu próprio; e segundo esta razão, glorificamos também duas vontades e operações naturais que mutuamente concorrem para a salvação do gênero humano".Não obstante isto, o monotelismo foi ressuscitado por um imperador bizantino a princípios do século VIII, e os maronitas no Líbano o ensinaram até o século XII, quando se reconciliaram com o papado romano. Anotamos os seguintes versículos bíblicos, os quais também nos falam das duas naturezas e das duas vontades do Verbo encarnado:
"Jesus, vendo-a chorar, e bem assim os judeus que a acompanhavam, agitou-se no espírito (Humano) e comoveu-se" (Jo. 11:33).
"38Entonces Jesus lhes disse: Minha alma (humana) está muito triste, até a morte; fique aqui, e velem comigo. 39 Indo um pouco adiante, prostrou-se sobre seu rosto, orando e dizendo: meu pai, se for possível, passe de mim esta taça; mas não seja como eu quero (vontade humana), mas sim como você (vontade divina)" (MT. 26:38-39).
"Pai, se quiser, pára de mim esta taça; mas não se faça minha vontade (humana) (em grego thelema, ??????), a não ser a tua (a vontade divina)" (Lc. 22:42).
"Então Jesus, clamando a grande voz, disse: Pai, em suas mãos encomendo meu espírito (humano). E havendo dito isto, expirou" (Lc. 23:36).
"Porque desci do céu, não para fazer minha vontade (a humana), a não ser a vontade (divina) do que me enviou" (Jo. 6:38).
"Agora está turvada minha alma; e o que direi? Pai, me salve desta hora? Mas para isto cheguei a esta hora" (Jo. 12:27).


«Trullanum» segundo

Transcorridos onze anos desde o Sexto Concílio Ecumênico, Terceiro de Constantinopla, o imperador Justiniano II (685-695) convocou um novo concílio no ano 692, no palácio imperial, com a assistência de bispos do Oriente. Por ter feito a sessão no mesmo lugar do anterior, lhe conhece como o segundo "Trullanum". Alguns historiadores não o consideram como Concílio Ecumênico, alegando que finalmente o papado romano não o aceitou e que as Igrejas orientais sim o consideraram como ecumênico, mas suplementar dos concílios quinto e sexto, os quais não tinham decretado leis de disciplina eclesiástica, e por isso foi chamado "Quinisexta" ou "Quinisextum".
A convocatória deste novo concílio obedeceu a que os anteriores não tinham tratado de resolver questões relacionadas com a moral do clero e a disciplina eclesiástica. O anterior concílio não se ocupou de tocar o tema de uma reforma de costumes, especialmente nos círculos eclesiásticos. O nicolaísmo*(2) tinha jogado raízes profundas e estava fazendo sentir seus efeitos devastadores na Igreja. Era tão lamentável a situação moral da igreja oficial, que este concílio chegou a aprovar 102 rigorosos cânones relacionados com ética e disciplina do clero. Em contraposição ao costume clerical romano, este concílio aprovou o casamento dos diáconos e presbíteros, e para evitar grosseiros escândalos, o clero foi submetido a um estrito controle nas altas esferas eclesiásticas, pois o prurido da castidade tinha conduzido a uma falsa moral e a um mal dissimulado farisaísmo. Isto equivalia a uma ratificação do lembrado no primeiro concílio de Nicéia, em contra do celibato obrigatório. Nesta matéria e em todas as relacionadas com vida da Igreja e os assuntos que correspondem a Deus e Seus propósitos, devemos sempre nos remeter às Sagradas Escrituras, as quais nos ensinam a verdade. Por exemplo diz em 1 Timóteo 4:1-3:
*(2) Doutrina e prática espúrea introduzida na igreja com a formação de uma casta clerical ou hierarquía dominante, com autoridade sobre o povo ou laicos, os crentes comuns. Este ensino a herdou o protestantismo do sistema católico romano. O nicolaísmo começou na igreja ainda nos tempos do apóstolo João em sua fase de meras obras, as quais eram aborrecidas pela igreja (Apo. 2:6); mas essas obras sofreram um desenvolvimento e se converteram em doutrina nos tempos de Constantino o Grande (Ap. 2:15)."1 Mas o Espírito diz expressamente que nos últimos tempos alguns apostatarão da fé, escutando a espíritos enganadores e a doutrinas de demônios; 2pela hipocrisia de mentirosos que, tendo a consciência cauterizada, 3proibirão casamento, e mandarão abster-se de mantimentos que Deus criou para que com ação de graças participassem deles os crentes e os que conheceram a verdade".
Aí vemos claramente que o celibato clerical é uma doutrina de demônios herdada das raízes religiosas babilônicas. O celibato fomenta o escândalo e a imoralidade sexual. Nessa mesma carta, 1 Timóteo 3:2, Paulo diz:
"Mas é necessário que o bispo seja irrepreensível, marido de uma só mulher, sóbrio, prudente, decoroso, hospitaleiro, apto para ensinar".
"5Por esta causa te deixei em Creta, para que corrigisse o deficiente, e estabelecesse anciões (bispos) em cada cidade, assim como eu te mandei; 6 o que for irrepreensível, marido de uma só mulher, e tenha filhos crentes que não estejam acusados de dissolução nem de rebeldia" (Tito 1:5-6).
Este concílio reconheceu o Cânom completo dos livros do Novo Testamento, tal como tinha sido reconhecido pelos sínodos romanos (382) e o terceiro de Cártago (397), sem que isso signifique que estes concílios tenham determinado o Cânom. Esse é um assunto do Espírito Santo. O Cânom dos livros inspirados pelo Espírito Santo não é determinado pela Igreja. A normatividade e autoridade das Escrituras Sagradas são determinadas Por Deus; e os livros que compõem o Novo Testamento estiveram em uso desde os primeiros dias do cristianismo, e o mesmo Senhor foi se encarregando de que a Igreja fosse recusando os que não eram inspirados, mas a autoridade e a inspiração dos livros sagrados só a determinou o Espírito Santo. O trabalho dos concílios só consistiu em reconhecê-los como sagrados, por causa dos livros apócrifos que circulavam já na época. A Igreja reconhece o que Deus revelou em Sua Palavra e dá testemunho disso.
No cânom 36, o concílio confirmou de novo a decisão da Calcedônia de que "a sede de Constantinopla gozará de privilégios iguais que a sede da velha Roma... e segunda depois dela". Alexandria ocupava o terceiro lugar, Antioquia o quarto e Jerusalém o quinto. Para esta época, as sedes patriarcais de Alexandria, Antioquia e Jerusalém, estavam em mãos dos muçulmanos, de maneira que essas filas eclesiásticas tinham mais de simbólicos que de reais. O espírito desta decisão era consolidar a Constantinopla frente às pretensões romanas, que ao final eram escoras sólidas para que se protocolizasse mais tarde o Cisma do Oriente.
Este concílio proibiu a representação de Cristo como um cordeiro, ordenando em troca que fosse representado em forma humana.
A papa romano Sergio I (687-701), não reconheceu este concílio como ecumênico, e se negou a assentir as decisões deste concílio, devido principalmente ao cânom 36; mas pouco mais tarde outro papa, João VII (705-707), no ano 705, confirmou-as com algumas modificações; mas se ia alargando o abismo de separação entre ambas as facções da cristandade, e os sucessores de João VII, não obstante, finalmente recusaram a ecumenicidade do mesmo.


Resumo cristológico

Deus não permitiu que um assunto tão fundamental como a cristologia tenha ficado na história sem a devida e correta definição. Aqui podemos intercalar um resumo do que ao respeito foi esclarecido nos primeiros concílios ecumênicos.
Em Nicéia (325) combateu-se o arianismo e se proclamou que Cristo é da mesma substância que o Pai, e por conseguinte, Cristo é Deus.
Em Constantinopla I (381) condenou-se o apolinarismo e se definiu a humanidade de Cristo; ou seja, que Cristo é verdadeiro, perfeito e impecável homem.
Em Éfeso (431), condenando ao nestorianismo, definiu-se que em Jesus há uma só pessoa.
Na Calcedônia (451), falhando a controvérsia eutiquiana e seu monofisismo, esclareceu que Jesus é uma pessoa única que possui duas naturezas, a divina e a humana.Em Constantinopla III (680-681), ao condenar ao monotelismo, definiu-se que no Jesus operavam duas vontades, a divina e a humana, estando a humana submetida à divina em perfeita harmonia. Estas foram as principais controvérsias em torno do Senhor Jesus Cristo.