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TERCEIRO CONCÍLIO DE CONSTANTINOPLA
(VI Ecumênico)
Celebrado mediante duas convocatórias: A primeira no ano 680-681, pelo imperador Constantino IV Pogonato, quem convidou ao papa Agatão a que enviasse seus legados; a segunda convocada pelo imperador Justiniano II no ano 692. debateu-se sobre a doutrina das duas vontades em Cristo e Suas duas naturezas, condenando o monoenergismo ou monotelismo. A conclusão foi que Cristo tinha duas vontades, existindo uma perfeita harmonia entre ambas. Sua vontade humana estava sempre em sujeição a Sua vontade divina. Suas sessões foram levadas a cabo na cidade de Constantinopla, a Nova Roma.
Antecedentes
No século VII o cristianismo atravessava uma crise decadente devido a uma relaxação moral e espiritual da maior parte do povo cristão. A Igreja estava sofrendo uma preocupante debilidade; em qualquer parte reinava uma frieza devida a que a fé nas pessoas era só nominal; o clero e os monges davam um pobre testemunho de vida, e já começava muita da desorientação e ignorância que caracterizou aos crentes da Idade Média.
A começos do século VII se fechou a era histórica do mundo antigo e alvorecia a idade Média com seu obscurantismo nas costas, e ainda persistia o engano monofisita em torno das duas naturezas de Cristo, pois muitos bispos orientais seguiam defendendo esta doutrina, sem que muitos outros deixassem de ser simpatizantes. Os imperadores bizantinos tinham feito falidos intentos por reconciliar aos ortodoxos com os monofisitas, e uma vez mais o intentou o imperador Heráclio (610-641) por sugestão de Sérgio, patriarca de Constantinopla (610-638), achando para isto apóio em certos escritos atribuidos a Dionísio o Areopagita, o qual havia dito que Cristo obrava ações divinas e humanas por uma só energéia.
Sergio, tratando de solucionar o conflito divisor propõe uma "bizantina" fórmula que ao final não foi mais que uma nova heresia, pois pediu suspender esta controvérsia sobre se Cristo obrava por meio de uma ou mais energéia. Sergio propôs que todos estivessem de acordo em que no Verbo encarnado havia duas naturezas, mas uma só operação e uma só vontade (thélema) divino-humana, que ele denominava "única energia natural divino-humana", ao qual lhe chamou "monotelismo", de monos, um, sozinho, sem companhia, e thélein, querer, escolher, atuar por vontade; quer dizer, um só querer, uma só vontade. Em outras palavras, Sergio queria conjugar duas afirmações pretendidamente complementares: Cristo possui uma só energia (agradando aos monofisitas) e dupla natureza (agradando aos partidários da Calcedônia); daqui que lhe desse também o nome de monoenergismo. No ano 633 se proibiu falar de uma ou de duas energias em Cristo; não obstante, Sergio manteve sua terminante oposição às duas energias, por acreditar que isso exigia atribuir a Cristo duas vontades apostas entre si. Em princípio, Sergio teve um relativo êxito em seus propósitos, pois obteve a reconciliação de muitos bispos orientais, e de passagem obteve a aprovação papal no pouco versado Honório I (625-638), quem por escrito esteve de acordo com os pontos de vista heréticos de Sergio; também obteve a aprovação do imperador Heráclio, quem oficializou ao monotelismo mediante decreto imperial, e esta controvérsia seguia seu curso interminável.
Apesar de que esta heresia tinha sido elevada à categoria de doutrina oficial do Estado, o monotelismo logo encontrou seus decididos opositores tais como Sofrônio, bispo de Jerusalém, e muitos partidários dos anteriores concílios ecumênicos, em especial o da Calcedônia.
Paulo, o sucessor de Sergio no patriarcado de Constantinopla, vendo que longe de unir, o monotelismo tinha dividido mais a cristandade, teve a decisão de suspender
as discussões a respeito da vontade de Cristo, o qual registrou no documento chamado "Typus", que foi convertido em decreto imperial por Constante II (641-668). Em Roma, Martinho I (649-655), o sucessor do Honório no papado, condenou o monotelismo em um sínodo de 105 bispos reunido no Latrão no ano 649, declarando-se a favor das duas energias ou vontades em Cristo, condenando a Sergio e pronunciando-se contra os decretos imperiais dos anos 638 e 648. Essa ousadia, por ordem do Imperador Constante II, custou-lhe o desterro e sua posterior morte em Crimea, por causa dos maus tratos de que foi vítima.
O mais conspícuo, atrevido e competente oponente à heresia do monotelismo foi o monge Máximo o Confessor (580-662), discípulo do Sofrônio e considerado o mais destacado teólogo grego do século VII, quem por esta causa, e também por ordem do Imperador Constante II, sofreu o cárcere, a mutilação da língua e da mão direita e posterior desterro, a fim de que não seguisse falando ou escrevendo sobre este proibido tema. Ele era oriundo de Hasfin, Palestina, localidade sobre o Golan, no Tiberias. Entre outras coisas, ele tinha escrito em 642 no Opúsculo 7: Exposição doutrinal remetida ao Chipre, para o diácono Marinho, o seguinte:
«Por conseguinte, aceitando a doutrina dos Santos pais, recusamos qualquer diminuição na vontade, nas operações naturais e na natureza mesma do só e único Verbo de Deus feito homem e Cremos que Ele mesmo é, ao mesmo tempo, em todos os aspectos, perfeito Deus e perfeito homem, pois possui por natureza e de modo perfeito todas as características próprias das naturezas divina e humana, suas vontades e operações. Desta sorte evitamos que, pela subtração de alguma das propriedades que definem a uma ou outra dessas duas naturezas, cheguemos não só a diminuir a realidade de cada uma das duas partes nas que e às que subsiste, a não ser inclusive à completa eliminação de ambas ou de alguma delas. E que tinha uma verdadeira vontade humana, como cumpre a sua natureza, ao igual a possui uma vontade divina por sua essência, o manifesta o próprio Verbo com aquela muito humana súplica com a que rogava ser sacado da morte e que fez em favor de nossa salvação, dizendo: "Pai, se for possível, afasta de mim este cálice". Revelava deste modo a debilidade de sua carne e que sua manifestação na carne não era uma fantasia que enganasse a quem a via, fazendo errar seus sentidos. Mas sim realmente era homem, como o prova sua vontade natural, da que emanou essa súplica de liberação, segundo o projeto da salvação».*(1)
(1) Máximo o Confessor. Meditações sobre a agonia de Jesus. Editorial Cidade Nova. 1990. Pág. 28.
O concílio
Assim estavam as coisas quando é entronizado um novo imperador bizantino, Constantino IV (668-685), quem via a necessidade de restabelecer a harmonia eclesiástica e o fortalecimento político no império, convocando um novo concílio ecumênico, inclinando-se na ocasião a favor da corrente da Calcedônia. É bom anotar que para essa época, muitas províncias do antigo império romano bizantino tinham sido invadidas, não só pelos bárbaros, mas também também pelos árabes muçulmanos, de maneira que os principais bispados monofisitas estavam em mão dos árabes islâmicos; de modo que a controvérsia monofisita estava quase que eliminada..
«Trullanum Primun»
O Terceiro Concílio Ecumênico de Constantinopla foi inaugurado em 7 de novembro do ano 680, e duraram as reuniões até em 16 de setembro do seguinte ano. Muitos historiadores designam este concilio com o nome de "Trullanum Primun" devido a que se realizaram suas sessões na cúpula do palácio imperial, chamada "Trullo". A suas reuniões assistiram 174 bispos orientais e oito emissários ocidentais, os quais levaram um documento escrito do sínodo romano, defendendo a mesma posição que tinha tomado Martinho I, e que lhe havia custado o desterro e a morte.
Apesar da entristecedora maioria oriental, foi presidido o concílio pelos legados romanos junto com o imperador. Nas três primeiras sessões, de um total de vinte e dois, foram lidas as atas dos concílios ecumênicos de Éfeso, Calcedônia e Constantinopla II; nas seguintes se baralharam os textos dos chamados antigos pais, tanto por parte dos monotelitas como pelos ortodoxos.
Este concílio condenou definitivamente o monotelismo, que afirmava a existência em Cristo de uma única vontade, anulando de passagem os decretos imperiais de Heráclio e Constante II. Deste modo foi excomungado Macário, patriarca da Antioquia, principal defensor da heresia monotelita. Como autores e propagadores da heresia foram condenados post mortem, entre outros, Sergio, patriarca de Constantinopla, Paulo e Pedro de Constantinopla. Não obstante que este concílio era presidido por legados papais, foi excomungado o papa Honório I, e seu nome eliminado da lista dos bispos, declarando-o herege, o mesmo que ao patriarca Sergio. A todos eles os apelidaram de instrumentos do diabo, e os anatematizaram.
O concílio se declarou claramente em favor de duas vontades e duas energias existentes em Cristo, como "concorrentes mas mutuamente nele para a salvação da raça humana". Conciliando a doutrina dos cinco concílios precedentes, neste concílio fica fixada a doutrina cristológica: deixou-se por certo que posto que Jesus Cristo era verdadeiro Deus como também verdadeiro homem, tinha que ter, na unidade de pessoa, duas naturezas, uma divina e outra humana, com duas vontades correspondentes a cada uma de suas naturezas. Desta maneira este concílio deu por terminado o prolongado debate que durante muitos séculos se sustentou sobre a relação de Jesus Cristo com Deus e sobre a maneira em que tinham que achar-se no Senhor Jesus o divino e o humano. O anterior foi consignado na seguinte fórmula de fé:"Cremos que é um da Santa Trindade, ainda depois da encarnação, nosso Senhor Jesus Cristo, nosso verdadeiro Deus, dizemos que suas duas naturezas resplandecem em sua única hipóstasis, em que mostrou tanto seus milagres como seus padecimentos, durante toda sua vida redentora, não na aparência, a não ser realmente; posto que em uma só hipóstasis se reconhece a natural diferença por querer e obrar, com comunicação da outra, cada natureza o seu próprio; e segundo esta razão, glorificamos também duas vontades e operações naturais que mutuamente concorrem para a salvação do gênero humano".Não obstante isto, o monotelismo foi ressuscitado por um imperador bizantino a princípios do século VIII, e os maronitas no Líbano o ensinaram até o século XII, quando se reconciliaram com o papado romano. Anotamos os seguintes versículos bíblicos, os quais também nos falam das duas naturezas e das duas vontades do Verbo encarnado:
"Jesus, vendo-a chorar, e bem assim os judeus que a acompanhavam, agitou-se no espírito (Humano) e comoveu-se" (Jo. 11:33).
"38Entonces Jesus lhes disse: Minha alma (humana) está muito triste, até a morte; fique aqui, e velem comigo. 39 Indo um pouco adiante, prostrou-se sobre seu rosto, orando e dizendo: meu pai, se for possível, passe de mim esta taça; mas não seja como eu quero (vontade humana), mas sim como você (vontade divina)" (MT. 26:38-39).
"Pai, se quiser, pára de mim esta taça; mas não se faça minha vontade (humana) (em grego thelema, ??????), a não ser a tua (a vontade divina)" (Lc. 22:42).
"Então Jesus, clamando a grande voz, disse: Pai, em suas mãos encomendo meu espírito (humano). E havendo dito isto, expirou" (Lc. 23:36).
"Porque desci do céu, não para fazer minha vontade (a humana), a não ser a vontade (divina) do que me enviou" (Jo. 6:38).
"Agora está turvada minha alma; e o que direi? Pai, me salve desta hora? Mas para isto cheguei a esta hora" (Jo. 12:27).
«Trullanum» segundo
Transcorridos onze anos desde o Sexto Concílio Ecumênico, Terceiro de Constantinopla, o imperador Justiniano II (685-695) convocou um novo concílio no ano 692, no palácio imperial, com a assistência de bispos do Oriente. Por ter feito a sessão no mesmo lugar do anterior, lhe conhece como o segundo "Trullanum". Alguns historiadores não o consideram como Concílio Ecumênico, alegando que finalmente o papado romano não o aceitou e que as Igrejas orientais sim o consideraram como ecumênico, mas suplementar dos concílios quinto e sexto, os quais não tinham decretado leis de disciplina eclesiástica, e por isso foi chamado "Quinisexta" ou "Quinisextum".
A convocatória deste novo concílio obedeceu a que os anteriores não tinham tratado de resolver questões relacionadas com a moral do clero e a disciplina eclesiástica. O anterior concílio não se ocupou de tocar o tema de uma reforma de costumes, especialmente nos círculos eclesiásticos. O nicolaísmo*(2) tinha jogado raízes profundas e estava fazendo sentir seus efeitos devastadores na Igreja. Era tão lamentável a situação moral da igreja oficial, que este concílio chegou a aprovar 102 rigorosos cânones relacionados com ética e disciplina do clero. Em contraposição ao costume clerical romano, este concílio aprovou o casamento dos diáconos e presbíteros, e para evitar grosseiros escândalos, o clero foi submetido a um estrito controle nas altas esferas eclesiásticas, pois o prurido da castidade tinha conduzido a uma falsa moral e a um mal dissimulado farisaísmo. Isto equivalia a uma ratificação do lembrado no primeiro concílio de Nicéia, em contra do celibato obrigatório. Nesta matéria e em todas as relacionadas com vida da Igreja e os assuntos que correspondem a Deus e Seus propósitos, devemos sempre nos remeter às Sagradas Escrituras, as quais nos ensinam a verdade. Por exemplo diz em 1 Timóteo 4:1-3:
*(2) Doutrina e prática espúrea introduzida na igreja com a formação de uma casta clerical ou hierarquía dominante, com autoridade sobre o povo ou laicos, os crentes comuns. Este ensino a herdou o protestantismo do sistema católico romano. O nicolaísmo começou na igreja ainda nos tempos do apóstolo João em sua fase de meras obras, as quais eram aborrecidas pela igreja (Apo. 2:6); mas essas obras sofreram um desenvolvimento e se converteram em doutrina nos tempos de Constantino o Grande (Ap. 2:15)."1 Mas o Espírito diz expressamente que nos últimos tempos alguns apostatarão da fé, escutando a espíritos enganadores e a doutrinas de demônios; 2pela hipocrisia de mentirosos que, tendo a consciência cauterizada, 3proibirão casamento, e mandarão abster-se de mantimentos que Deus criou para que com ação de graças participassem deles os crentes e os que conheceram a verdade".
Aí vemos claramente que o celibato clerical é uma doutrina de demônios herdada das raízes religiosas babilônicas. O celibato fomenta o escândalo e a imoralidade sexual. Nessa mesma carta, 1 Timóteo 3:2, Paulo diz:
"Mas é necessário que o bispo seja irrepreensível, marido de uma só mulher, sóbrio, prudente, decoroso, hospitaleiro, apto para ensinar".
"5Por esta causa te deixei em Creta, para que corrigisse o deficiente, e estabelecesse anciões (bispos) em cada cidade, assim como eu te mandei; 6 o que for irrepreensível, marido de uma só mulher, e tenha filhos crentes que não estejam acusados de dissolução nem de rebeldia" (Tito 1:5-6).
Este concílio reconheceu o Cânom completo dos livros do Novo Testamento, tal como tinha sido reconhecido pelos sínodos romanos (382) e o terceiro de Cártago (397), sem que isso signifique que estes concílios tenham determinado o Cânom. Esse é um assunto do Espírito Santo. O Cânom dos livros inspirados pelo Espírito Santo não é determinado pela Igreja. A normatividade e autoridade das Escrituras Sagradas são determinadas Por Deus; e os livros que compõem o Novo Testamento estiveram em uso desde os primeiros dias do cristianismo, e o mesmo Senhor foi se encarregando de que a Igreja fosse recusando os que não eram inspirados, mas a autoridade e a inspiração dos livros sagrados só a determinou o Espírito Santo. O trabalho dos concílios só consistiu em reconhecê-los como sagrados, por causa dos livros apócrifos que circulavam já na época. A Igreja reconhece o que Deus revelou em Sua Palavra e dá testemunho disso.
No cânom 36, o concílio confirmou de novo a decisão da Calcedônia de que "a sede de Constantinopla gozará de privilégios iguais que a sede da velha Roma... e segunda depois dela". Alexandria ocupava o terceiro lugar, Antioquia o quarto e Jerusalém o quinto. Para esta época, as sedes patriarcais de Alexandria, Antioquia e Jerusalém, estavam em mãos dos muçulmanos, de maneira que essas filas eclesiásticas tinham mais de simbólicos que de reais. O espírito desta decisão era consolidar a Constantinopla frente às pretensões romanas, que ao final eram escoras sólidas para que se protocolizasse mais tarde o Cisma do Oriente.
Este concílio proibiu a representação de Cristo como um cordeiro, ordenando em troca que fosse representado em forma humana.
A papa romano Sergio I (687-701), não reconheceu este concílio como ecumênico, e se negou a assentir as decisões deste concílio, devido principalmente ao cânom 36; mas pouco mais tarde outro papa, João VII (705-707), no ano 705, confirmou-as com algumas modificações; mas se ia alargando o abismo de separação entre ambas as facções da cristandade, e os sucessores de João VII, não obstante, finalmente recusaram a ecumenicidade do mesmo.
Resumo cristológico
Deus não permitiu que um assunto tão fundamental como a cristologia tenha ficado na história sem a devida e correta definição. Aqui podemos intercalar um resumo do que ao respeito foi esclarecido nos primeiros concílios ecumênicos.
Em Nicéia (325) combateu-se o arianismo e se proclamou que Cristo é da mesma substância que o Pai, e por conseguinte, Cristo é Deus.
Em Constantinopla I (381) condenou-se o apolinarismo e se definiu a humanidade de Cristo; ou seja, que Cristo é verdadeiro, perfeito e impecável homem.
Em Éfeso (431), condenando ao nestorianismo, definiu-se que em Jesus há uma só pessoa.
Na Calcedônia (451), falhando a controvérsia eutiquiana e seu monofisismo, esclareceu que Jesus é uma pessoa única que possui duas naturezas, a divina e a humana.Em Constantinopla III (680-681), ao condenar ao monotelismo, definiu-se que no Jesus operavam duas vontades, a divina e a humana, estando a humana submetida à divina em perfeita harmonia. Estas foram as principais controvérsias em torno do Senhor Jesus Cristo.
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